Chuva de poucas horas que parou São Paulo, principal metrópole do país, bairros inteiros castigados na Serra Fluminense, calor histórico no Sul, cidades cobertas por granizo e um tornado com força rara no Paraná. Ao longo do ano, o clima virou notícia mês após mês no Brasil, com eventos extremos que deixaram mortos, milhares de desabrigados e prejuízos espalhados por diferentes regiões do país. Leia também: O que é um ciclone extratropical e como ele se forma? Entenda em infográficos Ciclone visto do espaço pela Nasa: satélite mostra dimensão do fenômeno sobre o Sul do Brasil O primeiro grande alerta veio ainda em janeiro, quando um forte temporal atingiu a cidade de São Paulo. A chuva intensa e concentrada provocou alagamentos em avenidas e estações de trem e metrô, arrastou carros e deixou parte da capital sem energia elétrica. O volume registrado em poucas horas superou o acumulado esperado para todo o mês, paralisando o transporte público, agravando o trânsito e levando a Defesa Civil a acionar, pela primeira vez, um sistema de alerta direto nos celulares da população. Telefone celular exibe alerta severo da Defesa Civil para tempestade em São Paulo X/reprodução Em abril, foi a vez do Rio de Janeiro enfrentar uma das situações mais críticas do ano. Chuvas intensas atingiram a Região Serrana e levaram Petrópolis a decretar situação de emergência. Em apenas um dia, os acumulados ultrapassaram a marca de 300 milímetros em alguns pontos, provocando deslizamentos, alagamentos e danos à infraestrutura urbana. O impacto das chuvas se espalhou por diferentes regiões do estado, da capital à Costa Verde, colocando o Rio em estágio máximo de atenção. Em fevereiro, o Rio Grande do Sul enfrentou uma onda de calor intensa, com temperaturas acima dos 40 °C em várias cidades do interior. O calor prolongado afetou a rotina da população, pressionou o abastecimento de água, trouxe prejuízos ao campo e expôs a dificuldade das cidades em lidar com temperaturas cada vez mais elevadas. Ainda no Sul, o avanço de tempestades severas voltou a provocar estragos. Em Erechim, no norte gaúcho, uma forte chuva de granizo atingiu dezenas de bairros, deixou centenas de pessoas feridas e causou danos em escolas, unidades de saúde e prédios públicos. A cidade decretou situação de emergência, suspendeu aulas e precisou acolher famílias que ficaram sem condições de permanecer em casa após a destruição de telhados e estruturas. Chuva de granizo afetou 17 mil moradores em Erechim (RS) Milena Mezalira/Comunicação Prefeitura Municipal de Erechim Na última semana, a grande São Paulo voltou a enfrentar um episódio de vento extremo associado à passagem de um ciclone extratropical, que derrubou árvores, interrompeu serviços. Com rajadas próximas de 100 km/h em pontos da capital, o vendaval deixou cerca de 2,26 milhões de imóveis sem energia na Região Metropolitana — número equivalente a cerca de um quarto dos clientes — e afetou também o abastecimento de água em bairros que dependem de bombeamento, além de provocar cancelamentos de voos em Congonhas e Guarulhos, impactar a circulação de trens e levar ao fechamento temporário de parques e equipamentos públicos; no interior, houve registro de deslizamento com morte em Campos do Jordão, na Serra da Mantiqueira. O episódio mais extremo do ano, no entanto, foi registrado no interior do Paraná. Um tornado de grande intensidade atingiu municípios da região central do estado, com impacto especialmente severo em Rio Bonito do Iguaçu. O fenômeno deixou ao menos seis mortos, provocou destruição generalizada e obrigou milhares de pessoas a deixarem suas casas. Classificado entre os tornados mais fortes já registrados no Paraná, o evento levou à decretação de calamidade pública e mobilizou uma força-tarefa estadual e federal para atendimento às vítimas e início da reconstrução. Galerias Relacionadas O que esperar de 2026? 2026 começa sob a influência de um La Niña (fenômeno que esfria as águas do oceano) de fraca intensidade, mas com sinais claros de enfraquecimento ao longo do verão. Segundo modelos climáticos globais, o fenômeno deve perder força nos primeiros meses do ano e dar lugar a um período de neutralidade no Pacífico ainda no primeiro trimestre, reduzindo a atuação de padrões climáticos globais mais definidos e ampliando o peso de sistemas regionais na definição do tempo ao longo do ano. Mesmo com intensidade limitada, o La Niña ainda pode interferir no regime de chuvas. A Organização Meteorológica Mundial (WMO) estima cerca de 55% de chance de que o fenômeno influencie o clima global entre dezembro de 2025 e fevereiro de 2026. No Brasil, historicamente, esse padrão está associado ao aumento das precipitações no Norte e em parte do Nordeste, enquanto o Sul tende a registrar volumes abaixo da média. No Centro-Oeste e no Sudeste, a atuação de sistemas regionais passa a ter papel mais decisivo durante a estação chuvosa. — O La Niña atua agora, mas já em um estágio fraco e com tendência de enfraquecimento rápido. A neutralidade deve se estabelecer ainda no primeiro trimestre de 2026 — afirma a meteorologista Andrea Ramos. La Niña enfraquece e neutralidade ganha espaço A partir do fim do verão, com a transição para condições neutras do ENSO — quando não há nem La Niña nem El Niño —, as previsões sazonais se tornam mais incertas. A neutralidade reduz a influência dominante do Pacífico sobre a circulação atmosférica global e amplia a variabilidade regional, fazendo com que frentes frias, cavados, áreas de baixa pressão e massas de ar tenham peso maior na definição do tempo ao longo do ano. — Em anos neutros, não existe um padrão dominante comandando a circulação atmosférica. O comportamento do tempo passa a depender muito mais do que acontece em escala regional — explica o meteorologista Cesar Soares, da Climatempo. Embora os avanços da meteorologia permitam identificar tendências de médio e longo prazo, antecipar como será o tempo com um ano de antecedência segue sendo um desafio. A atmosfera responde de forma sensível a pequenas variações de temperatura, umidade e pressão, o que limita a capacidade dos modelos de longo prazo de indicar com precisão o regime de chuvas, ondas de calor ou períodos de frio. — Pequenas mudanças hoje podem gerar cenários completamente diferentes meses à frente, o que torna inviável prever com exatidão quantos eventos extremos vão ocorrer ou quando eles acontecerão — explica Marcio Bueno, meteorologista da TempoOK Meteorologia. A influência dos oceanos adiciona outra camada de complexidade às projeções. Fenômenos como El Niño e La Niña alteram padrões de vento, temperatura e precipitação em escala global, mas sua intensidade, duração e momento de atuação nem sempre podem ser antecipados. No Brasil, a temperatura do Atlântico também exerce papel relevante na configuração do tempo. — Mesmo variações sutis na temperatura da superfície do mar já são suficientes para mudar todo o cenário atmosférico. Em muitos casos, o Atlântico pode pesar mais do que um El Niño ou La Niña de fraca intensidade — destaca Marcio Bueno. O que os modelos indicam para o Pacífico em 2026 As análises mais recentes da Columbia Climate School (IRI) apontam que existe a possibilidade de aquecimento do Pacífico e eventual configuração de um El Niño na segunda metade de 2026, mas a probabilidade desse cenário não supera 50% e ainda é considerada uma tendência distante. Os modelos climáticos também indicam que o verão 2025/2026 pode apresentar períodos mais secos em parte do Brasil, já que frentes frias tendem a ter dificuldade de avançar pelo interior do país, reduzindo a formação de sistemas organizados de chuva, como a Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS) e corredores de umidade. Para o outono, a tendência é de aquecimento dos oceanos, o que pode favorecer temperaturas acima da média em alguns momentos do ano. No campo dos eventos extremos, especialistas reforçam que tornados, tempestades severas e ciclones extratropicais não são consequência direta de La Niña ou El Niño. Esses fenômenos dependem de condições atmosféricas de curto prazo, como calor intenso, alta umidade e forte cisalhamento do vento. — O que a climatologia permite é identificar períodos mais favoráveis à ocorrência desses sistemas, não prever eventos específicos. Tornado é análise de tempo, não de clima — afirma Cesar Soares. Do ponto de vista climatológico, primavera e verão continuam sendo os períodos de maior frequência de sistemas convectivos severos no país. O verão, que começa no fim de dezembro, também concentra os maiores volumes de chuva do ano e períodos prolongados de calor. Além do comportamento do clima, 2026 também será marcado por eventos astronômicos relevantes. 17 de fevereiro — Eclipse solar anular (anel de fogo). Não será visível no Brasil; o fenômeno poderá ser observado principalmente na Antártida e de forma parcial em áreas da África e da América do Sul. 3 de março — Eclipse lunar total (lua de sangue). Visível parcialmente no Brasil, com observação também em partes da Ásia, Austrália, ilhas do Pacífico e Américas. 12 de agosto — Eclipse solar total. A faixa de totalidade passa por Groenlândia, Islândia, Espanha e Portugal. No Brasil, o eclipse será visto de forma parcial, incluindo áreas do Nordeste. 27 e 28 de agosto — Eclipse lunar parcial. Visível parcialmente no Brasil, além das Américas, Europa, África e Ásia Ocidental. Com um início de ano ainda sob influência residual do La Niña e a expectativa de neutralidade nos meses seguintes, 2026 se desenha como um ano de transição climática, marcado por maior variabilidade regional, atenção constante a eventos extremos de curta duração e períodos de calor ao longo do calendário.