Integrantes do PT elevam o tom contra o Congresso, enquanto governo tenta manter pressão sem entrar em confronto aberto

Presentes aos atos do último domingo contra o projeto de lei da Dosimetria, quadros do PT e integrantes do governo mostraram tons diferentes nos posicionamentos em relação ao Congresso ao discursarem. Lideranças do partido foram duras nos ataques, enquanto ministros, preocupados com o risco de prejudicar o Planalto nas pautas que ainda precisam ser votadas este ano, evitaram o confronto aberto. Lula: Opinar sobre busca e apreensão da PF na Câmara 'só cabe' a Dino Há 'mais coisas a acertar': Lula diz ter mandado mensagem a Trump para agradecer retirada de sanções Há uma avaliação no governo de que o embate com o Congresso ajuda a turbinar a popularidade da gestão Lula porque os parlamentares são mal avaliados pela população. Além disso, o posicionamento reforça um caráter antissistema que pode render dividendos eleitorais. Há também um entendimento que não há, dados os últimos acontecimentos, como o governo ficar refém dos presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP) Mas o risco de um conflito institucional que pode paralisar o país faz com que os governistas evitem os ataques genéricos ao Congresso e se concentrem nas críticas objetivas ao PL da dosimetria. A gestão Lula ainda precisa que seja aprovado pelo Legislativo o orçamento e projeto de lei que reduz as isenções tributárias. O tom que o Planalto considera adequado para tratar do tema no momento foi dado por uma postagem da ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, ao comentar as manifestações no domingo: “As ruas do país falaram alto outra vez neste domingo: Sem Anistia! Sem redução de penas! Quem foi condenado por atentar contra a democracia tem de pagar por seus crimes. O Brasil não quer andar para trás”, escreveu a ministra. Já os petistas têm sido mais duros, como demonstraram na manifestação de domingo. O líder do partido na Câmara, Lindbergh Farias, disse no ato do Rio que o PT não pode se misturar com o Centrão. — Há seis meses atrás, eram eles que estavam nas ruas. Agora somos nós. E isso é por uma decisão política. A mobilização de vocês e também do presidente Lula, desde o caso do IOF, mudou a nossa postura. Nós não somos Centrão, não podemos nos misturar com o Centrão. Conhecido pelo perfil conciliador, o presidente do PT, Edinho Silva,afirmou, na manifestação de São Paulo, que os adversários tentaram impor uma agenda antipopular no Congresso Nacional. — Estamos disputando a agenda do futuro do Brasil. Eles estão tentando, como tentaram na última semana no Congresso Nacional, impor uma agenda antipopular. Eles tentam impedir a distribuição de renda. Eles não querem reconhecer os povos indígenas, como originários, são eles os primeiros habitantes do Brasil. Eles querem uma política de segurança pública racista, violenta e que aplaude chacina. Mas eles não previram que a agenda do povo brasileiro vem das ruas. Na semana passada, Motta se queixou a parlamentares pelo fato de o PT ter convocado atos contra o PL da dosimetria. Em resposta às críticas, Edinho disse que o Congresso optou por uma agenda impopular. “Tenho respeito pelos presidentes da Câmara, Hugo Motta, e do Senado, Davi Alcolumbre; sempre defendo o Congresso Nacional com expressão da democracia, mas as Casas optaram por uma agenda extremamente impopular, que gera instabilidade institucional, uma agenda de confronto político. Sempre vou procurar ser um agente do diálogo e da pacificação política, mas jamais vou deixar de defender o fortalecimento da democracia, e os interesses populares, jamais vou deixar de defender as posições históricas do PT”, disse, em nota. O ex-presidente do PT José Dirceu, que voltou a ter destaque na cúpula da legenda ao ser escalado para conduzir as discussões sobre a nova plataforma partidária, disse em um vídeo, gravado na manifestação em São Paulo, que chegou “a hora de começar a mobilizar o país para mudar o Congresso”. Cards de convocação para as manifestações traziam o slogan “Congresso inimigo do Povo”. Na Avenida Paulista, o público gritou "fora, Hugo Motta". Presente ao ato, o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Guilherme Boulos, criticou o projeto da dosimetria. — A dosimetria não é nada menos do que uma anistia envergonhada. A gente não quer saber nem de anistia sem vergonha nem de anistia envergonhada. Golpista bom é golpista preso. No ponto mais duro contra o Congresso, ao falar sobre as derrubadas dos vetos de Lula no projeto do licenciamento ambiental e da aprovação pelo Senado da PEC do marco temporal, Boulos disse que “eles (parlamentares) estão querendo ficar de costas para o povo brasileiro”. O ministro decidiu participar do ato em cima da hora. Na sexta-feira, em café com jornalistas, ao ser perguntado se iria à manifestação, Boulos não confirmou. Titular da pasta do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeirinha também participou da manifestação na Paulista e disse que a “dosimetria abre portas para a anistia”. De acordo com integrantes do governo, Lula tem revelado internamente grande frustração com Motta e Alcolumbre. O presidente avaliava que havia construído com os dois uma relação mais afável e fraterna em contraposição ao tom institucional dos antecessores Arthur Lira (PP-Al) e Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Mas a atitude de Motta ao pautar a derrubada do aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) em junho e a reação de Alcolumbre diante da indicação de Jorge Messias para o Supremo Tribunal Federal (STF) mudaram essa percepção. Mesmo assim, a avaliação é que não há como romper totalmente as pontes. Nesta segunda-feira, Lula, em um aceno pela pacificação,afirmou ser grato aos senadores e deputados pela aprovação de projetos da pauta econômica enviados pelo Executivo ao Parlamento. — Eu sou muito grato a tudo que o Congresso fez por nós nesses três anos de governo, tanto Senado quanto Câmara, aquilo que não aprovaram, possivelmente porque a gente não teve capacidade de convecê-los a aprovar. Mas na questão econômica, o Congresso foi muito correto esse tempo todo com o meu governo — disse o presidente em evento da Apex, em Brasília.