'Sol poente': Após ser pivô de disputa judicial familiar, tela de Tarsila do Amaral é vista em chão de mansão de banqueiro

"Sol poente", de Tarsila do Amaral Reprodução Uma das obras mais famosas de Tarsila do Amaral, "Sol poente", de 1929, volta a ser envolvida em nova polêmica. Após batizar uma operação deflagrada pela Delegacia Especial de Atendimento à Pessoa da Terceira Idade (Deapti) em 2022 (quando Sabine Boghici, filha do marchand romeno Jean Boghici (1928-2015), foi presa por suspeita de roubar da mãe, Geneviève, então com 82 anos, obras no valor de R$ 720 milhões), a tela foi vista em uma postagem no Instagram no chão da mansão do banqueiro Roberto Setubal, herdeiro do Itaú. Roubado por nazistas: livro de orações judaico do século XV pode ser leiloado por US$ 5 milhões Para combate ao Alzheimer: Rifa beneficente oferece um Picasso de 1 milhão de euros por apenas 100 euros A foto da obra foi postada por sua ex-mulher, Daniela Fagundes, em um canto junto a uma escada, e a história foi levada a público pela newsletter "A vida apenas", de Claudia Castelo Branco. A questão é que a obra não poderia ser comercializada, por questões legais, e Claudia diz ter perguntado ao banqueiro por que estar em sua propriedade, que respondeu negando tê-la adquirido. Postagem de Daniela Fagundes que mostraria 'Sol poente' na mansão de Roberto Setubal Reprodução/Instagram/A Vida Apenas Avaliada em ao menos R$ 250 milhões, "Sol poente" foi apreendida na operação de 2022 junto a outras tela da modernista: "O sono" (1928), que chegaria a R$ 300 milhões, e "Pont Neuf" (1922), avaliada em R$ 150 milhões. As duas primeiras foram exibidas em sua retrospectiva de Tarsila no MoMA, em 2018. Tarsila, Guignard, Di Cavalcanti... Veja os quadros roubados por filha de colecionadora "Sol poente" e as outras duas obras de Tarsila do Amaral escaparam de um incêndio no apartamento da família, em Copacabana, na Zona Sul do Rio, em 13 de agosto de 2012. O fogo destruiu cerca de 10% do acervo particular de Boghici, incluindo o célebre quadro “Samba” (1925), de Di Cavalcanti, avaliado à época em R$ 50 milhões. Relembre o golpe em viúva Viúva de Boghici, Geneviève foi ludibriada por um grupo, que ofereceu tratamento espiritual para uma de suas filhas em troca de dinheiro. O contato com uma falsa vidente foi feito em janeiro de 2020, e a vítima chegou a pagar R$ 5 milhões pela suposta cura. Ao desconfiar que estivesse sendo vítima de um golpe, não quis mais realizar as transferências bancárias e passou então a ser mantida em cárcere privado, em seu apartamento, na Zona Sul do Rio, pela filha, entre fevereiro de 2020 e abril de 2021. Depois, Geneviève descobriu que todo o golpe havia sido articulado pela filha, Sabine, que também passou a vender obras de arte para uma galeria em São Paulo. Acusada de envolvimento em esquema de sequestro, cárcere privado, extorsão, estelionato e roubo, Sabine era casada com Rosa Stanesco Nicolau, conhecida como Mãe Valéria de Oxóssi, também acusada pelos crimes, que foi presa no Instituto Penal Santo Expedito, no Complexo de Gericinó. Em 2023, Sabine morreu antes de ser interrogada numa audiência criminal do processo. A causa foi apontada inicialmente como suicídio. Uma série documental sobre Sabine e a disputa em torno da coleção Jean Boghici está sendo desenvolvida pela HBO. Veja fotos: Filha rouba mais de R$ 700 milhões em obra de arte da mãe Autora do livro "Tarsila — Os melhores anos" (2011), a crítica e curadora Maria Alice Milliet teve contato mais frequente com Jean Boghici atuando como diretora da Fundação José e Paulina Nemirovsky, de São Paulo. No caso das Tarsilas, Maria Alice acredita que o conjunto se destaca tanto pelo período, entre os anos 1920 e 1930, o mais valorizado da artista, quanto pela relação com as vanguardas internacionais. — É o período em que ela mais se aproxima do surrealismo, criando uma atmosfera de sonho, mas absolutamente brasileira, como podemos ver em "Sol poente". Talvez tenha sido o momento mais criativo da Tarsila, em que ela já estava distante da influência do (pintor cubista Fernand) Léger.