Pele para livros, rostos para bonecas: justiça detalha destino dos restos humanos no escândalo do necrotério de Harvard

A sentença que condenou Cedric Lodge, ex-gerente do necrotério da Faculdade de Medicina de Harvard, a oito anos de prisão detalhou nesta semana o destino final de partes de corpos humanos que deveriam ter sido cremados ou devolvidos às famílias. Segundo a acusação, cérebros, peles, mãos, rostos e cabeças dissecadas foram tratados “como bugigangas” e enviados a compradores em diferentes estados, após o uso dos cadáveres em pesquisas científicas. Ex-gerente do necrotério de Harvard é condenado a oito anos por venda de restos humanos; material foi parar até em loja de bonecas Mulher admite negociar restos humanos desviados da Faculdade de Medicina de Harvard em sua loja de bonecas nos EUA De acordo com documentos judiciais citados pelo The New York Times, Lodge, de 58 anos, chegou a fornecer pele humana para que fosse curtida e transformada em couro, com a finalidade de encadernar um livro — episódio descrito pela procuradora federal assistente Alisan Martin como uma “realidade profundamente horrível”. Em outro caso, ele e a esposa, Denise Lodge, venderam o rosto de um homem, sem qualquer controle sobre o uso posterior da peça. Esquema interestadual e compradores As investigações apontam que o casal, que lucrou entre US$ 40 mil e US$ 95 mil, encontrava compradores por meio de redes sociais, como o Facebook. Alguns retiravam o material pessoalmente; em outras ocasiões, os restos mortais eram enviados pelo correio. Pagamentos eram feitos via PayPal em nome de Denise Lodge, muitas vezes com descrições explícitas, como “cérebros” ou “cabeça número 7”, segundo reportagem do Boston Globe. Os promotores afirmam que, entre 2018 e março de 2020, Lodge retirou partes de corpos doados ao Programa de Doação Anatômica de Harvard sem o conhecimento da universidade ou das famílias. Em maio de 2018, por exemplo, foram enviadas 24 mãos, dois pés e partes de crânios a um comprador, por pouco mais de US$ 3 mil. Meses depois, duas cabeças e cinco rostos foram vendidos separadamente. O caso começou a vir à tona após a ex-esposa de Jeremy Pauley, da Pensilvânia, alertar a polícia local de East Pennsboro sobre o acúmulo de restos mortais em sua casa. Inicialmente, Pauley se apresentou como especialista em preservação de “espécimes médicos aposentados”, mas uma nova denúncia levou a uma busca policial que encontrou globos oculares, órgãos, cérebros, pele humana e crânios armazenados em baldes e sacos plásticos. Inicialmente, Pauleydisse às autoridades que era especialista em preservação, especificamente de "espécimes médicos descartados" e restos humanos históricos Reprodução/Redes sociais/Facebook A partir dessa apreensão, a investigação federal se expandiu e passou a identificar Lodge como o principal fornecedor. Harvard suspendeu temporariamente seu programa de doação de corpos em 2023 e notificou cerca de 400 famílias que poderiam ter sido afetadas. Apesar de processos movidos por parentes de doadores, um juiz de Massachusetts entendeu que a universidade não agiu de má-fé nem era legalmente responsável pelos atos do funcionário. Pauly teria comprado US$ 4.000 em restos mortais de Candace Scott, que, segundo a polícia, os roubou de uma funerária parceira da Universidade do Arkansas Reprodução/Redes sociais/Facebook Além dos Lodges, ao menos outras seis pessoas se declararam culpadas no caso. Entre elas está Katrina Maclean, que admitiu neste mês ter comprado restos humanos desviados de Harvard, usados na produção de bonecas em sua loja. Também foi condenada Candace Chapman Scott, ex-funcionária de um crematório no Arkansas, sentenciada a 15 anos de prisão por furtar e vender restos mortais. Após a condenação, a Faculdade de Medicina de Harvard classificou as ações de Lodge como “abomináveis” e reafirmou pesar às famílias. A universidade afirmou que, embora o processo criminal tenha sido encerrado, o impacto do esquema sobre os doadores e seus parentes ainda está longe de ser superado.