Todos têm uma opinião sobre o Lancellotti

Esta semana ficamos sabendo da proibição — alguns chamaram de “censura eclesiástica” — imposta pelo cardeal Dom Odilo Scherer ao polêmico padre Júlio Lancellotti. Tal medida aflorou, entre os católicos, defesas ao padre, seguidas de críticas ao cardeal, mas também aplausos ao cardeal, misturados a críticas ao padre militante. Tal movimento de turba é esperado, principalmente num Brasil que transferiu sua torcida da Seleção Brasileira de Futebol à política e seus agentes, às vidas privadas e públicas de artistas, religiosos, entre outros. Todavia, não tapemos o sol com a peneira, pois parece óbvio que a decisão do arcebispo realmente é a de realizar um impedimento claro ao padre, e imaginando que Dom Odilo não seja um inquisidor sem escrúpulos, ele deve ter seus motivos para tal. Lancellotti é, clara e inegavelmente, um comunista, ainda que ele possa negar, ainda que os teólogos da libertação associados a ele já tenham uma retórica pronta para defendê-lo disso; fato é que, a dita “teologia da libertação” abraçada — essa sim — publicamente pelo referido padre, é um casaco ideológico, ou melhor, um parasita ideológico-teológico dentro da Igreja Católica já há décadas descortinada e dissecada. A filiação política desses padres da libertação é tão óbvia que, por motivo de cansaço, não perderei muito tempo nisso; seria como ter de provar ao mundo que Alexandre Moraes não é isento. + Leia notícias de Política em Oeste A pergunta que, todavia, persiste após o impedimento eclesiástico de Lancellotti transmitir suas missas e estar ativo nas redes é: por que o arcebispo achou melhor agir assim? Aqui reside toda curiosidade católica e jornalística daqueles que cobriram, e estão ainda a cobrir, os fatos. Cabe-nos lembrar que, recentemente, o padre Lancellotti enfrentou sérias acusações de ter se exibido sexualmente a um menor de idade ; posteriormente, outra acusação foi levada à Cúria de São Paulo por um ex-coroinha que, supostamente, aos 11 anos de idade, em 1987, teria sido acariciado sexualmente pelo padre dentro de uma igreja em que ele atuava . Pelas informações disponíveis, a primeira acusação de exibição a um menor por videochamada foi arquivada pela arquidiocese, enquanto a segunda continua sob investigação interna da Igreja. Os motivos do afastamento do padre Júlio Lancellotti Muitos nas redes vinculam tal censura a um suposto andamento das investigações do caso do ex-coroinha, já afirmando que seria indício claro de que poderia haver verdades na referida acusação. Fato é que tal investigação ocorre sob absoluto sigilo, e que tais inferências são meramente especulativas e até irresponsáveis sem mais informações confiáveis disponíveis a esse respeito. E é aí que chegamos ao cerne da questão. Tal comportamento de turba, nas redes, embaça uma leitura realística do caso; em ambos os lados, grupos já estão prontos ou para elevar o padre a um grau de santidade inconteste, como se as acusações fossem parte de um grande esquema conservador de mutilação do sacerdote comunista; ou para culpá-lo sem mais demora, afinal, a um padre à esquerda seria lógico supor que fosse culpado de abuso e mil outros erros. Como dizia um sargento do batalhão em que prestei serviço militar: “Tudo é possível, até mesmo nada”. Uma das posturas mais louváveis estimuladas pelo catolicismo é a da temperança e da prudência no agir e julgar, a verdade só prevalece onde há cuidado e inteligência, e quando se abdica de ambos, o que fica é tão somente gritaria e estridências opinativas de pessoas sem controle emocional e capacidade de análise. Por ora, o que se sabe é o que se divulgou; e se seu afastamento se deu por opiniões políticas extremamente incompatíveis com a fé tradicional do magistério católico, ou por atualizações das investigações em curso, ou ainda por qualquer outro motivo desconhecido, fato é que não sabemos ao certo, e qualquer pré-acusação ou pré-absolvição cai no terreno do “bobagens para gados”. Homem da política Lancellotti é um padre político, abertamente segregado pela sua visão ideológica afunilada, deixando quase nenhum espaço para uma percepção transcendente que compõe o núcleo da fé católica romana; seu jeito despudorado de defender políticos de sua matriz ideológica — ainda que seja razoável pensar que muitos de seus chefes, em segredo, concordem com ele — tende a alimentar uma animosidade entre fiéis que não concordam com sua ideologia ou que simplesmente estão de saco cheio de sua militância de púlpito. Não seria nenhum susto para mim que o cardeal Scherer o tenha afastado por ter ficado esgotado dessa militância soberba, cansativa e nada católica do padre; lembremos também que 2026 é ano de eleição presidencial, e por isso é presumível que, adiantando-se ao frenesi político que com certeza tomará o país, Dom Odilo tenha colocado freios às recorrentes histerias militantes que o padre sempre esteve pronto a ostentar ao lado de Lula e outros mais. O padre Júlio Lancellotti recebeu o apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva | Foto: Ricardo Stuckert/Presidência da República A prudência é necessária Conscientemente sei que, hoje, qualquer coluna que peça prudência tende a cair sob ataques furiosos daqueles cruzados de agendas próprias, e que, após pedir cuidado e análise, de pronto tornamo-nos “isentões”. No entanto, acusar ou absolver outras pessoas, tendo por base tão somente uma animosidade ideológica e acusações prévias a serem analisadas, não só não é “cristão”, como também não é racional. A primeira atitude que temos de voltar a cultuar neste país é prudência analítica, não porque isso é coisa de gente “limpinha” que “paga de isenta”, mas porque é coisa de gente inteligente. Como no caso do gato de Schrödinger, a nós, meros mortais que não participamos da investigação da Cúria paulista , tanto o sim quanto o não são plenamente possíveis neste instante; e quando isso ocorre, vale mais o cuidado da análise prudente do que as opiniões formuladas em 3 segundos de fidelidade grupal no Instagram. https://www.youtube.com/watch?v=638JJJQ5AFg O post Todos têm uma opinião sobre o Lancellotti apareceu primeiro em Revista Oeste .