Conheça a Santa Con, 'baratona' que reúne centenas de versões do Papai Noel em Nova York

Num sábado, há cerca de 15 anos, Deb Pollack caminhava em direção à Sinagoga Town & Village, em Nova York, quando se deparou com dezenas de pessoas vestidas com jaquetas de lã e gorros vermelhos. Era o SantaCon, o tradicional circuito de bares que toma as ruas da cidade com versões barulhentas e regadas a álcool do Papai Noel. Primeira entrevista: Ela foi filmada com o chefe num show do Coldplay. Humilhada e ameaçada de morte, decidiu quebrar o silêncio Os livros do ano: confira 100 títulos que foram destaque em 2025, entre ficção, não ficção, poesia e quadrinhos Pollack achou graça e continuou seu caminho. Após o serviço religioso de Shabat, seu pai, Hugh Pollack, conhecido por suas brincadeiras, aventurou-se no mar de Papais Noéis ali perto e convidou um dos foliões para o almoço de Kidush. O Papai Noel saboreou com prazer kugel, bagels e salmão defumado, lembrou Deb, de 31 anos. Por mais de um quarto de século, a SantaCon tem sido um fato da vida — amada por alguns, detestada por outros — em uma cidade onde encontros bizarros são parte da paisagem. O evento começou em São Francisco, em 1994, como uma crítica bem-humorada sobre o consumismo do Natal; desde que chegou a Nova York, em 1998, críticos a acusaram de se tornar uma festa desordeira e depravada. Sem mostrar o rosto: Sia chega aos 50 após conquistar o pop mundial e preservar a vida fora dos holofotes No mês passado, pedimos a nova-iorquinos que compartilhassem suas memórias da invasão anual do Papai Noel. Os leitores escreveram sobre encontros fofos e brigas de bar na SantaCon; Papais Noéis andando educadamente de metrô ou vomitando na balsa de Staten Island; Papais Noéis usando fantasias requintadas feitas à mão; e Papais Noéis sem roupa nenhuma. Também descreveram o evento como mágico, sem sentido, divertido, irritante, criativo e confuso. O que ninguém parecia sentir, porém, era ambivalência. O evento deixou uma impressão duradoura, mesmo em nova-iorquinos que nunca participaram. Vai com tudo A SantaCon e as reações que ela inspira são o tema de um novo documentário de Seth Porges, que em 2021 descobriu um acervo de filmagens dos primeiros anos do evento. Na época, considerava que aquele era “o pior dia do ano”. Mas começou a assistir gravações do primeiro encontro de Papais Noéis, organizado por um grupo de São Francisco conhecido como Cacophony Society. Os organizadores do evento, então chamado de “Santarchy”, o viam como uma maneira de romper com o status quo. Porges ficou impressionado com as expressões dos transeuntes ao se depararem com uma multidão de Papais Noéis pela primeira vez. — Em vez de se sentirem imediatamente repelidos, desdenhosos ou horrorizados, víamos uma ampla gama de emoções — disse ele. — Podia ser medo e horror, ou admiração, alegria e encantamento. O evento depois chegou a Portland e Los Angeles, antes de alcançar Nova York. — Se você vai trazer algo para Nova York, tem que ser com tudo — disse Chris Hackett, membro da Brooklyn Cacophony Society e organizador da primeira SantaCon em Nova York. Treino para bumbum e samba com meninas da comunidade: como Bruna Griphao se prepara para o Carnaval Hackett, de 53 anos, achou que o encontro poderia ser uma forma de fazer jus à reputação de caos e espetáculo público que faz parte da mitologia da cidade. No documentário, que estreou mês passado, os cerca de cem Papais Noéis presentes são vistos perambulando pelo Central Park, encontrando Michael Moore na 5ª Avenida e simulando um protesto em frente à sede das Nações Unidas. — O Polo Norte merece um assento no Conselho de Segurança da ONU! — grita um Papai Noel. O evento deveria ser ousado e descontraído, disse Hackett, mas agora teme que parte desse espírito tenha se perdido. Os organizadores originais do SantaCon acabaram se distanciando do evento; a Cacophony Society realizou um funeral para o SantaCon em 2014. Amaya Nichole se mudou para Nova York em 2020 — o raro ano em que o SantaCon foi cancelado. Em dezembro do ano seguinte, ela e sua colega de quarto seguiram o circuito de bares até o porão do One and One, um pub no East Village, onde conheceram outros Papais Noéis. Era o grupo de nova-iorquinos menos reservado que ela já tinha visto, disse Nichole, de 24 anos. Ela já participou de quatro SantaCons e, este ano, está convencendo uma amiga que nunca foi. Há divergências Nem todos compartilham desse entusiasmo. A opinião pública sobre a SantaCon azedou por volta da década de 2010: panfletos espalhados pelo Lower East Side alertavam os Papais Noéis para manterem distância. Um artigo no The New York Times descreveu o evento como “um parasita”. Para alguns, a SantaCon representa um risco ocupacional. O evento era impopular entre a equipe do pronto-socorro do Hospital Beth Israel em Manhattan, disse Stephanie Stavinsky, que era voluntária lá durante a SantaCon em 2011. — Virou uma piada — lá vem mais um Papai Noel vomitando — disse Stavinsky, 55 anos, enfermeira que mora em Westchester. O evento parecia divertido, acrescentou ela, mas “os efeitos colaterais não eram nada divertidos para quem tinha que fazer a limpeza”. Por volta de 2015, Michael Harris e sua namorada estavam sentados no bar Down the Hatch, na West 4th Street, quando ouviram o som de copos quebrando atrás deles. Um grupo de Papais Noéis “bêbados” havia começado uma briga, contou ele. Um barman pulou o balcão para tentar separar a confusão. Quando o barman voltou, agachou-se e descobriu que alguns dos Papais Noéis aparentemente haviam decidido não esperar na fila do banheiro. Ele se levantou com “dois ou três jarros cheios de urina”, lembrou Harris, de 36 anos: — Foi uma loucura. Ainda assim, muitos devotos do SantaCon acham que o evento é injustamente difamado. Eles apontam que ele se tornou uma organização sem fins lucrativos em 2012 e que arrecadou milhares de dólares para instituições de caridade, incluindo City Harvest, The Ali Forney Center e The Secret Sandy Claus Project. Jim Glaser, participante do SantaCon desde 2000 e um de seus líderes não oficiais, acredita que o ressentimento em relação ao SantaCon é, em grande parte, produto de “isca de cliques preguiçosa”. Os elementos criativos do evento são frequentemente negligenciados, argumentou ele. — Meu Deus, para cada Papai Noel urinando, existem uns 300 figurinos incríveis — disse Glaser, diretor executivo do coletivo artístico Kostume Kult. Em 2014, Glaser decidiu reabilitar a reputação do evento. Ele organizou uma reunião com oficiais do Departamento de Polícia de Nova York e garantiu que os Papais Noéis permaneceriam nas calçadas. Ele contratou o advogado de direitos civis Norman Siegel para explicar o direito do grupo de se reunir, garantido pela Primeira Emenda. — Acho que a percepção que mudou é: “O SantaCon veio para ficar, vocês não vão acabar com ele” — disse ele. — Eles têm advogados agora. Dá até casamento Carlos Peraza está grato por ter participado do SantaCon por impulso em 2023. Na fila do lado de fora do Houston Hall, no Lower Manhattan, ele conheceu Tiffany Foo, e eles se deram bem facilmente. Conversa sobre faculdade, restaurantes e a vida na cidade. O casal foi morar junto em Manhattan em agosto. Numa era de aplicativos de namoro, ambos disseram se sentir sortudos por terem se conhecido da maneira tradicional. — Costumamos dizer que nos conhecemos num bar, o que não está errado — disse Foo, de 26 anos. No entanto, eles não voltaram ao evento desde aquele primeiro ano. — Eu fui uma vez e deu certo — disse Peraza, de 25 anos. — Quem encontra o amor na SantaCon?