Programa de segurança do RJ ampliado por Bacellar vira centro de indicações políticas

YURI EIRAS RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) Afastado da presidência da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro) por causa da investigação que o tornou suspeito de vazar uma operação para o ex-deputado TH Joias, o deputado estadual Rodrigo Bacellar (União) já foi chamado em plenário de pai do Segurança Presente, programa de segurança pública estadual criado há uma década. Bacellar manteve influência no projeto mesmo após deixar a Secretaria de Governo de Cláudio Castro (PL) e assumir a presidência da Alerj. Segundo políticos ouvidos pela Folha, o deputado foi, nos últimos dois anos, o responsável por encaminhar as indicações dos policiais que atuam no programa. Criado em 2014, o Segurança Presente é centro de indicações políticas, de acordo com documentos e relatos de pessoas próximas do governo. Três deputados ouvidos sob anonimato dizem que as indicações fortalecem as bases eleitorais. Procurada, a assessoria de Bacellar não respondeu. O programa, que tem 58 bases em 27 municípios, usa policiais militares da ativa e da reserva, bombeiros, policiais civis e penais, além de civis egressos das Forças Armadas. O patrulhamento é feito em trio -dois PMs e um civil. Apenas policiais fazem prisões e conduções à delegacia. Só de policiais militares são 907 fixos no programa, além da oferta 1.900 vagas diárias que podem ser preenchidas por outros PMs em dias de folga. Apesar de atuar no policiamento e recorrer majoritariamente PMs, o Segurança Presente não está sob o escopo da Secretaria de Segurança Pública. Ele é comandado pela Secretaria de Governo, hoje ocupada por André Moura (União), ex-líder do ex-presidente Michel Temer (MDB) na Câmara. Moura é quem recebe as indicações, função antes exercida por Bacellar. O ex-presidente da Alerj ocupou a Secretaria de Governo de 2021 a 2023 e, durante a gestão, ampliou o orçamento do Segurança Presente. Mais robusto, o projeto que originalmente visava policiamento em áreas turísticas e de comércio se estendeu para o interior do estado. A Folha de S.Paulo encontrou no sistema do governo estadual ofícios de pelo menos quatro deputados indicando nomes para o Segurança Presente em 2025. Um deles, Rosenverg Reis (MDB), sugeriu mais de 15 policiais em dois anos. Emails confirmam o recebimento das indicações pela pasta, porém não há informação se os indicados foram, de fato, alocados. "É natural policiais irem ao gabinete e pedirem recomendação. No entanto, o deputado não é responsável pelos critérios de seleção e de compliance para a entrada de servidor", disse o gabinete de Rosenverg, em nota. Segundo relatos, policiais também procuram vereadores para pedir alocação no programa. A reportagem perguntou se a Secretaria de Governo gostaria de se posicionar sobre os relatos de indicações políticas, contudo a pasta não comentou. Em nota, a secretaria afirmou que o critério de ingresso determina que a participação é voluntária e que o policial deve ter bom histórico --não responder a processo disciplinar, apresentar certidões negativas de antecedentes criminais e ser classificado com bom comportamento. O decreto de 2019 que regulamenta o acesso ao programa não cita se indicações políticas são proibidas ou permitidas. Apenas prevê que o ingresso "dependerá da análise curricular em processo seletivo simplificado e impessoal". Os ofícios de deputados mencionam os policiais nominalmente. O Segurança Presente foi criado às portas da Copa do Mundo de 2014 e da Olimpíada de 2016, e visava reforço no policiamento em áreas turísticas da cidade. O projeto ganhou orçamento próprio na gestão Bacellar. "O Segurança Presente teve inicialmente muita resistência dentro do parlamento, e ela foi diminuindo quando o governo começou com a estrutura própria de financiamento, diferente da original, que seria parte privada. Acredito que esses parlamentares, mesmo os que foram mais resistentes, viram alguma possibilidade de retorno na forma de um dividendo político", afirma Robson Rodrigues, ex-coronel da PM e pesquisador do Lav-Uerj (Laboratório de Análise da Violência da Universidade do Estado do Rio de Janeiro). Em julho, quando assumiu como governador em exercício, Bacellar foi ao município de Armação de Búzios lançar o que seria a "pedra fundamental" de uma base do Segurança Presente. O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) esteve na agenda. As bases são contêineres instalados em praças ou vias de movimento. No fim do ano passado, a Alerj aprovou um repasse de R$ 50 milhões ao governo fluminense para reforço do Segurança Presente. Bacellar foi o porta-voz do investimento à época e afirmou que o recurso seria para compra de drones, viaturas elétricas, bicicletas elétricas e câmeras. Além de indicarem policiais, deputados pedem transferências e substituições e negociam por bases do Segurança Presente em seus redutos eleitorais. Em agosto, um mês antes da prisão, o ex-deputado TH Joias fez vídeo ao lado de André Moura, no palácio Guanabara, anunciando que o governo inauguraria, em breve, uma base em bairros de atuação do ex-parlamentar, como Marechal Hermes e Oswaldo Cruz. No vídeo TH Joias agradece a Castro e Bacellar. Em 2021, o TCE-RJ (Tribunal de Contas do Estado) analisou os números do Segurança Presente, à época sob o governo Wilson Witzel (PSC), e observou que o estado quadriplicou os gastos com o programa, mas os índices criminais nas áreas cobertas não caíram por completo. O tribunal concluiu que o governo deveria melhorar a eficácia do programa e dar transparência ao orçamento.