Zelensky apresenta plano de paz com zonas desmilitarizadas e garantias de segurança para a Ucrânia

O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, detalhou nesta semana um novo plano de paz para o fim da guerra com a Rússia que inclui a criação de zonas desmilitarizadas no leste do país, a possibilidade de estabelecer uma zona econômica livre no Donbass e garantias de segurança internacionais para evitar uma nova invasão russa. A proposta faz parte de um documento de 20 pontos negociado por enviados ucranianos e americanos durante reuniões realizadas no fim de semana na Flórida e é tratada por Kiev como a principal base, até agora, para um eventual encerramento do conflito. Entenda: Ucrânia anuncia retirada de Siversk em meio a avanço russo e ataques em larga escala contra infraestrutura do país Ofensiva: Ataque russo em larga escala deixa ao menos três mortos e provoca apagões na Ucrânia Segundo Zelensky, a Rússia deve apresentar uma resposta após conversas diretas com representantes dos Estados Unidos. O presidente ucraniano afirmou que o plano propõe garantias de segurança fornecidas por Washington, pela Otan e por países europeus, prevendo uma resposta militar coordenada caso Moscou volte a atacar o território ucraniano. O texto também reafirma a soberania da Ucrânia e propõe um pacto de não agressão entre os dois países, acompanhado por um mecanismo internacional de monitoramento. No centro das discussões está o futuro do Donbass, região estratégica no leste da Ucrânia, palco de combates desde 2014 e parcialmente ocupada pela Rússia. Zelensky afirmou que uma “zona econômica livre” é uma das alternativas em análise. De acordo com ele, negociadores americanos trabalham com duas opções principais: a criação de uma zona desmilitarizada ou de uma zona econômica especial. Qualquer retirada de tropas ucranianas, frisou, teria de ocorrer sob condições claras, com manutenção do controle administrativo e policial por parte de Kiev. — Há duas opções: ou a guerra continua, ou algo terá de ser decidido em relação a todas as possíveis zonas econômicas — disse o presidente, ressaltando que a Ucrânia é contrária a uma retirada simples de suas forças e que qualquer área desocupada por tropas ucranianas continuaria sendo policiada pelo próprio país, e não por forças russas. Vídeo: General russo morre em atentado a bomba contra carro em Moscou O plano de 20 pontos é visto como uma atualização de um documento anterior, com 28 pontos, negociado semanas atrás pelo enviado americano Steve Witkoff com representantes russos. Esse texto inicial foi amplamente interpretado como favorável às exigências do Kremlin, incluindo demandas territoriais. A nova versão, segundo Zelensky, reforça as garantias de segurança à Ucrânia e estabelece parâmetros mais claros para a questão militar. A Rússia insiste que a Ucrânia retire suas tropas de quase um quarto do território da região de Donetsk que ainda está sob controle de Kiev, como condição para um acordo de paz. O restante da área já se encontra sob ocupação russa. Zelensky reconheceu que temas sensíveis, como fronteiras e status territorial, teriam de ser resolvidos “em nível de líderes”, mas afirmou que o novo rascunho assegura à Ucrânia a manutenção de uma força militar de até 800 mil soldados em tempos de paz. Limitações políticas Parte significativa do plano reflete discussões recentes realizadas em Berlim, que envolveram Witkoff e Jared Kushner, além de líderes ucranianos e europeus. As negociações continuaram em Miami, onde a equipe do presidente Donald Trump se reuniu separadamente com o enviado russo Kirill Dmitriev e, em seguida, com representantes da Ucrânia e da Europa. Zelensky: Apenas pressão dos EUA pode convencer Rússia a parar guerra De acordo com Zelensky, houve avanços sobretudo na definição de propostas territoriais, embora não tenha sido possível alcançar um consenso pleno entre ucranianos e americanos. O presidente explicou que, caso a Ucrânia aceite recuar suas forças pesadas em cinco, 10 ou até 40 quilômetros em áreas de Donetsk que ainda controla — cerca de 25% da região — para viabilizar uma zona econômica praticamente desmilitarizada, a Rússia teria de realizar um recuo equivalente. Atualmente, forças russas estão posicionadas a cerca de 40 quilômetros a leste das cidades de Sloviansk e Kramatorsk, consideradas parte do chamado “cinturão de fortalezas” ucraniano, após a captura da cidade de Siversk. Apesar disso, Zelensky reconheceu que o presidente russo, Vladimir Putin, dificilmente aceitará concessões desse tipo. Neste mês, Putin afirmou que a Rússia tomará todo o leste da Ucrânia pela força caso as tropas ucranianas não se retirem. Ainda assim, o presidente ucraniano argumenta que Moscou enfrenta limitações políticas e diplomáticas para rejeitar abertamente o plano patrocinado pelos Estados Unidos. — Eles não podem dizer ao presidente Trump que são contra uma solução pacífica — afirmou, indicando que uma eventual obstrução russa poderia levar Washington a ampliar significativamente o apoio militar à Ucrânia e a impor novas sanções. Em coletiva anual: Putin se exime de culpa por mortes na guerra da Ucrânia e diz que fim do conflito depende de Kiev Forças internacionais O plano também prevê a presença de forças internacionais ao longo da atual linha de frente, que passaria a delimitar a zona econômica ou desmilitarizada, com o objetivo de impedir infiltrações russas. Moscou, no entanto, já rejeitou uma proposta europeia para que um eventual acordo de paz fosse fiscalizado por uma chamada “Coalizão dos Dispostos”, classificando a iniciativa como uma ameaça. Outro ponto sensível diz respeito à usina nuclear de Zaporizhzhia, ocupada por tropas russas desde 2022. Zelensky afirmou que o plano prevê a criação de uma zona econômica especial ao redor da central e a retirada das forças russas do local. A proposta americana sugere uma operação conjunta da usina por Ucrânia, Estados Unidos e Rússia, mas Kiev se opõe a esse modelo. Além disso, Zelensky disse que a Rússia teria de retirar suas tropas de outras quatro regiões ucranianas: Dnipropetrovsk, Mykolaiv, Sumy e Kharkiv. O texto também propõe que qualquer acordo final seja submetido a um referendo nacional, incluindo a decisão sobre a criação de uma zona econômica livre no Donbass. Com novo empréstimo da UE: Ucrânia evita crise orçamentária e fortalece sua posição nas negociações de paz Adesão à UE No campo político e institucional, o plano reafirma o direito da Ucrânia de buscar integração europeia e prevê a adesão do país à União Europeia (UE), com uma data definida de ingresso. Embora Kiev já seja candidata ao bloco, outros países, como a Albânia, são considerados prioritários no processo de ampliação. Não há, na nova versão do documento, nenhuma cláusula que proíba a Ucrânia de aderir à Otan, uma exigência recorrente da Rússia que constava do plano original de 28 pontos. O texto também prevê a criação de um fundo de investimentos para a Ucrânia, estimado em cerca de US$ 200 bilhões, com participação dos Estados Unidos e de países europeus. Ainda estão em discussão propostas americanas para receber compensações financeiras em troca das garantias de segurança oferecidas a Kiev, tema que, segundo Zelensky, ainda não foi incluído formalmente no documento. Entre os pontos finais, o plano estabelece que a Ucrânia deverá realizar eleições o mais rápido possível após a assinatura de um acordo de paz. Tanto a Rússia quanto os Estados Unidos defendem a realização de um pleito, apesar de o país estar sob lei marcial desde o início da invasão russa em larga escala, em fevereiro de 2022.