Os realizadores de “Anaconda” acertaram ao menos uma coisa: refazer o filme trash, amplamente mal recebido, de mesmo nome lançado em 1997 é uma ideia meio boba. Entram em cena Jack Black e Paul Rudd como dois perdedores de Buffalo, cidade no estado de Nova York, com um apego desmedido a esse artefato dos anos 1990 — um filme tão confiavelmente “ruim que é bom” a ponto de ter gerado várias continuações e até um derivado crossover envolvendo um crocodilo assassino. Dirigida por Tom Gormican, esta comédia de ação autorreferente até consegue fazer algumas tiradas espertas sobre a indústria do cinema e a cultura da nostalgia, mas seu espetáculo polido não alcança nem metade da diversão idiota de, por exemplo, ver Jon Voight ser esmagado por um boneco animatrônico de olhar lascivo. Talvez porque fantasias de crise de meia-idade raramente entreguem o que prometem. Griff (Rudd), um ator em dificuldades, e Doug (Black), um cinegrafista de casamentos que sonha em ser o próximo John Carpenter, se veem exatamente nessa situação quando partem para a selva brasileira para filmar uma versão “faça você mesmo” do clássico cafona. Ao lado dos amigos igualmente avariados, Claire (Thandiwe Newton) e Kenny (Steve Zahn), Griff e Doug querem desesperadamente reviver a magia da infância, quando os quatro fizeram um filme de Sasquatch com orçamento ultrabaixo que eles estão convencidos representar o auge de suas vidas. Doug é pai de uma criança que o idolatra, mas as partes fofas do filme são (felizmente) mantidas ao mínimo, e até o bromance entre Doug e Griff é tratado com distanciamento irônico. No Brasil, a equipe desce o rio Amazonas em uma balsa que eles não percebem ter sido roubada por Ana (Daniela Melchior), uma moradora local durona que foge de saqueadores armados. O meta-humor do filme desvia a atenção da fragilidade dessa trama mais áspera, que parece existir apenas para justificar algumas perseguições de moto e mortes colaterais. “Temas importantes!”, gritam Doug e Griff enquanto, de modo meio abobalhado, fazem brainstorm de ideias para o roteiro — e quando Ana exibe suas habilidades contra os vilões que a perseguem, o esboço de um thriller sobre uma ambientalista combativa enfrentando saqueadores inspira Doug, por um breve momento, a torná-la a protagonista. 'Energia' de Selton Mello Selton Mello acrescenta uma energia bizarra como um tratador de cobras, e o Kenny de Zahn — o mais incompetente desse bando de incompetentes — cambaleia pelo barco chapado de pílulas roubadas. Rudd repete seu número de simplório adorável e Black segue em modo maníaco, como de costume, à maneira de um Dom Quixote desgrenhado, mas o filme ao redor deles não acompanha totalmente a absurdidade sem freio dos atores. Quando a grande e terrível serpente finalmente entra em cena, algumas piadas escatológicas (uma envolve o corpo regurgitado de Doug e um javali selvagem presumivelmente morto) empurram o filme para uma direção mais viva e alegremente idiota — o que é positivo, já que estamos em um filme de “Anaconda”. Mas, apesar de todo o discurso sobre se afastar do original, a produção acaba sugada pela força gravitacional da propriedade intelectual. E, por mais habilidosa que seja ao integrar participações especiais e easter eggs, uma verdade dura permanece: a cobra que dá nome ao filme é meio sem graça.