Preso em tentativa de fuga, Silvinei foi condenado pelo STF na trama golpista e brigou com outro preso na cadeia

Desde que ascendeu ao cargo de diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF), em abril de 2021, a carreira de Silvinei Vasques passou por sucessivas reviravoltas até culminar em sua prisão na manhã desta sexta-feira (26), no Aeroporto Internacional de Assunção, no Paraguai, após romper a tornozeleira eletrônica e tentar deixar o Brasil sem autorização judicial. Segundo a Polícia Federal, o ex-dirigente tentava embarcar em um voo com destino a El Salvador quando foi detido pelas autoridades paraguaias, que o abordaram ao constatar que o passaporte apresentado não correspondia às suas informações pessoais. No último dia 16 de dezembro, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) condenou o ex-diretor-geral da PRF a 24 anos e seis meses de prisão por participação na trama que, segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), tinha como objetivo manter o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no poder após a derrota nas eleições de 2022. De acordo com a denúncia, Vasques integrava o chamado “núcleo dois” da organização golpista, responsável por “gerenciar” a atuação do grupo. Os integrantes desse núcleo foram considerados responsáveis por elaborar a chamada “minuta do golpe”, articular uma ação da PRF para dificultar o voto de eleitores da Região Nordeste no segundo turno das eleições de 2022 e ainda por conceber o plano “Punhal Verde Amarelo”, que previa o assassinato de autoridades. Segundo a acusação, os bloqueios em rodovias federais teriam sido coordenados por Silvinei, com auxílio de Marília Alencar e Fernando Oliveira. Natural de Ivaiporã (PR), Vasques ingressou na PRF em 1995 e construiu uma carreira de 27 anos na corporação. Durante o governo Bolsonaro, chegou ao cargo máximo da instituição, tornando-se diretor-geral. Ele se aposentou voluntariamente com salário integral em dezembro de 2022, logo após o fim das eleições presidenciais. Apoiador declarado de Bolsonaro, o então chefe da PRF chegou a pedir votos nas redes sociais para o candidato à reeleição às vésperas do segundo turno. Em publicação feita em sua conta pessoal no Instagram, na noite do sábado que antecedeu a votação, o policial escreveu: “Vote 22, Bolsonaro presidente”. O pedido estava acompanhado de uma foto da bandeira do Brasil, mas foi apagado no início da tarde do dia seguinte. Pouco antes do primeiro turno, Vasques também presenteou o então ministro da Justiça Anderson Torres — pasta à qual a PRF está subordinada — com uma camisa do Flamengo exibindo o número 22, usado por Bolsonaro nas urnas. O item foi mostrado pelos dois no auditório da sede da corporação, durante um evento oficial. Vasques era um dos dirigentes policiais mais alinhados ao bolsonarismo. Em janeiro de 2023, por exemplo, esteve por uma semana em Las Vegas, nos Estados Unidos, para participar da feira de tiro esportivo Shot Show 2022, evento frequentemente frequentado por filhos do ex-presidente, como o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e o vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ). Agosto de 2023 Em agosto de 2023, o ex-diretor da PRF foi preso pela primeira vez no âmbito da investigação sobre a interferência no pleito de 2022, acusado de ter se valido do cargo para atuar politicamente em favor de Jair Bolsonaro. Parte das acusações deu origem a apurações internas na Corregedoria da corporação e a investigações conduzidas pela Polícia Federal (PF). Segundo o inquérito, os crimes teriam sido planejados desde o início de outubro de 2022. No dia do segundo turno, foi realizado patrulhamento ostensivo direcionado à Região Nordeste do país. Após a confirmação da derrota de Bolsonaro para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a suspeita sobre a atuação da PRF mudou de foco. Enquanto apoiadores do candidato derrotado bloqueavam dezenas de rodovias pelo país, a corporação, sob o comando de Vasques, foi acusada de omissão por não conter os protestos — conduta que também passou a ser investigada pela PF. Silvinei também foi condenado a pagar multa de mais de R$ 500 mil por uso político da instituição durante a campanha eleitoral presidencial de 2022.A decisão unânime foi da 8ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal (TRF) da 2ª Região, que analisou o recurso de uma ação do Ministério Público Federal (MPF). Silvinei havia sido absolvido em primeira instância da acusação de que, entre agosto e outubro de 2022, utilizou a posição institucional e a imagem da PRF para “promover, reiteradamente” o então presidente e candidato à reeleição, por meio de entrevistas, postagens em redes sociais e atos públicos oficiais. Ao analisar o recurso, a 8ª Turma apontou entre as razões para condenação a entrega de uma camisa com número do candidato em cerimônia oficial, a convocação de servidores para eventos com conteúdo político-partidário e a publicação de mensagem com “pedido explícito de voto”. Soltura em 2024 Em agosto de 2024, o ministro Alexandre de Moraes determinou a soltura do ex-diretor-geral da PRF. Na decisão, o magistrado impôs uma série de medidas cautelares, entre elas o uso de tornozeleira eletrônica, a suspensão do porte de armas, o cancelamento do passaporte, a proibição de se ausentar da comarca, a obrigação de comparecimento semanal ao juízo e a vedação de contato com outros investigados. A soltura ocorreu um dia antes de Vasques completar um ano de prisão preventiva no Centro de Detenção Provisória II, no Complexo da Papuda, em Brasília. Até então, Moraes vinha negando os pedidos de liberdade provisória apresentados pela defesa, afirmando que permaneciam os requisitos legais para a manutenção da custódia cautelar. Os advogados alegavam que o ex-PRF não representava risco às investigações, por já estar aposentado, e citavam problemas de saúde. Durante o período na Papuda, Vasques recebeu visitas de 17 senadores, três por vez, autorizadas por Moraes. Entre eles, estavam Sergio Moro, Damares Alves, Ciro Nogueira, Jorge Seif, Marcos Pontes e Magno Malta. O ministro, no entanto, proibiu o ingresso de acompanhantes, como assessores, seguranças, advogados ou familiares. Briga na cadeia Vasques também foi alvo de um processo administrativo instaurado pela Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seape) do Distrito Federal para apurar eventual prática de transgressão disciplinar média. Após análise, a comissão decidiu pelo arquivamento do caso. Segundo os policiais penais, o ex-diretor da PRF poderia ter agido de “maneira inconveniente, faltando com os deveres de urbanidade frente às autoridades, aos funcionários, a outros sentenciados, aos visitantes e aos demais particulares no âmbito do estabelecimento penal”. A ocorrência foi registrada após uma suposta discussão com xingamentos entre Vasques e outro detento durante o banho de sol, em abril deste ano. Agentes relataram ter ouvido os insultos e apurado que a briga teria sido motivada por “fofocas” e que as desavenças entre os dois presos eram recorrentes.