Mianmar realiza eleições após cinco anos de guerra civil

A junta militar birmanesa organiza a partir de domingo eleições legislativas que apresenta como uma etapa rumo à reconciliação, quase cinco anos após tomar o poder com um golpe que desencadeou uma guerra civil em Mianmar. A ex-chefe do governo civil e vencedora do Prêmio Nobel da Paz em 1991, Aung San Suu Kyi, está presa desde o golpe militar de fevereiro de 2021, que pôs fim a uma década de democracia no país asiático. A ONU e vários países criticaram o processo eleitoral, que consideram uma tentativa da junta de limpar sua imagem. Ataque militar: Pelo menos 31 pessoas morrem em bombardeio a hospital em Mianmar Veja também: Um em cada quatro jornalistas mortos em 2025 trabalhava na América Latina, afirma ONG Repórteres Sem Fronteiras As eleições, em três turnos, ocorrerão ao longo de um mês e foram precedidas por uma onda de repressão contra qualquer indício de oposição. Mianmar, com cerca de 50 milhões de habitantes, está mergulhada em uma sangrenta guerra civil, e a votação não será realizada nas zonas controladas pelos rebeldes. — Os militares estão apenas tentando legalizar o poder que tomaram pela força — declarou um habitante da cidade de Myitkyina, no norte. — Quase ninguém se interessa por esta eleição. Mas alguns temem ter problemas caso se abstenham. Initial plugin text O chefe da junta, Min Aung Hlaing, não respondeu aos pedidos de entrevista da agência de notícias AFP. No entanto, nos meios de comunicação estatais, ele apresenta as votações como uma oportunidade de reconciliação, ao mesmo tempo que admite que o exército "continuará desempenhando um papel na condução política do país". Ex-chefe de governo civil presa O exército governa Mianmar desde a sua independência, exceto durante um período democrático entre 2011 e 2021, que gerou uma onda de reformas e otimismo quanto ao futuro do país. Porém, quando a Liga Nacional para a Democracia (LND), de Aung San Suu Kyi, superou amplamente os candidatos próximos aos militares nas eleições de 2020, o general Min Aung Hlaing tomou o poder alegando uma fraude eleitoral generalizada. Aung San Suu Kyi cumpre uma pena de 27 anos de prisão por várias condenações, que vão de corrupção até violação das normas anticovid. — Não acredito que ela considere estas eleições significativas, de modo algum — declarou seu filho, Kim Aris, do Reino Unido. A legenda comandada pela opositora ao regime foi dissolvida, assim como a maioria das siglas que participaram das eleições de 2020. Enquanto isso, o Partido da União, Solidariedade e Desenvolvimento (USDP), favorável aos militares, representa mais de 20% dos candidatos, segundo a rede 'Asian Network for Free Elections'. A junta anunciou que está processando mais de 200 pessoas por "tentarem sabotar o processo eleitoral", mirando qualquer manifestação ou crítica contra as eleições, em um país com cerca de 22 mil presos políticos, informou uma associação birmanesa de assistência a estes detidos. Votação questionada Após o golpe de Estado, muitos opositores pró-democracia uniram-se a guerrilhas para combater ao lado de grupos étnicos armados. Há vários meses, a junta trava uma ofensiva militar para conquistar mais território antes das eleições, mas reconhece que a votação não será possível em uma de cada sete circunscrições. — Existem muitas maneiras de alcançar a paz no país, mas não as escolheram. Preferiram organizar eleições — observou Zaw Tun, da pró-democracia Força de Defesa do Povo na região de Sagaing — Continuaremos lutando. Segundo o grupo 'Armed Conflict Location & Data' (Acled), que registra os atos de violência reportados pela imprensa, 90 mil pessoas morreram em Mianmar de todos os lados. A guerra civil também provocou 3,6 milhões de deslocados, de acordo com dados das Nações Unidas, e metade da população vive abaixo da linha da pobreza. — Não creio que alguém acredite que estas eleições contribuirão para resolver os problemas de Mianmar — afirmou o secretário-geral da ONU, António Guterres.