Sem novas regras para aluguel de curta temporada, fim do ano chega com alta procura e debates nos condomínios; entenda

O Rio que está lotado para o réveillon e que bate recordes no turismo chega ao fim de 2025 sem concluir o debate — que durou quase o ano inteiro na Câmara dos Vereadores — para estabelecer novas regras com objetivo de regulamentar e fiscalizar o aluguel de curta temporada. Sem definições, o verão que eleva as temperaturas nos termômetros também esquenta as discussões nos condomínios residenciais da cidade, parte deles em pé de guerra em torno do tema. Pressionados a tomar decisões voltadas à boa convivência, alguns optam por organizar a atividade, outros tratam de proibi-la, mas raramente se consegue unanimidade. Cinturão de segurança: Copacabana terá 17 pontos de revista; confira o que não pode entrar na praia no réveillon Novidades na virada: Réveillon de Copacabana terá 'balé' de fogos na virada; veja vídeo No Edifício Costa do Atlântico, em Ipanema, na Zona Sul, por exemplo, essa modalidade de aluguel foi abolida, e o síndico Ayrton Laurilo Netto enumera argumentos para a medida: — Preservativos usados eram frequentemente encontrados no playground. Registramos locatário embriagado dormindo no chão do elevador, e moradores fixos, assim como o circuito de segurança, identificaram excessos no número de hóspedes em algumas ocasiões. Tivemos até tentativa de suborno na portaria. Síndico, Ayrton Netto relata episódios graves envolvendo inquilinos e se diz contrário ao aluguel por temporada Júlia Aguiar/Agência O Globo Já Rick Aragão, administrador de imóveis no Leme que atua no mercado de curta temporada há dois anos, opina no sentido oposto. Para ele, é possível um equilíbrio entre o sossego dos moradores e a vocação turística da cidade. — Cada condomínio funciona de um jeito. Por isso, é importante que administradores e proprietários estejam atentos para orientar os hóspedes adequadamente. Um bom diálogo com a portaria e com os síndicos tende a reduzir conflitos — avalia. Administrador de imóveis locados, Rick Aragão defende diálogo para manter atividade Júlia Aguiar/Agência O Globo O fato é que a demanda está alta. Só entre turistas internacionais, dados da Embratur apontam que o Estado do Rio recebeu 1,97 milhão de visitantes de janeiro a novembro deste ano, aumento de 46% em relação aos mesmos meses de 2024. Já para o período entre 21 de dezembro e a primeira semana de janeiro de 2026, as reservas aéreas cresceram 10,7%, totalizando 67.506 bilhetes. Aumento na oferta Para acomodar tanta gente, se os hotéis comemoram uma média de ocupação de aproximadamente 80% neste ano — a maior do último triênio, segundo o Hotéis Rio —, também aumentou 25% a quantidade de imóveis ofertados na cidade para aluguel de curta duração, calcula o Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis e dos Condomínios Residenciais e Comerciais do Estado do Rio (Secovi-Rio). A entidade afirma que esse comportamento é inédito e acelerou a partir do último mês de novembro. — As plataformas estão aquecidas e, desde o mês passado, observamos transações em ritmo de alta temporada. Elas se estendem até o período pós-carnaval — afirma Leo Schneider, presidente do Secovi-Rio. Polêmica na Alerj: Deputado vai à Justiça contra a 'gratificação faroeste', que bonifica policiais por mortes em operações no Rio Pelas regras atuais, quando o assunto são imóveis alugados por plataformas como o Airbnb, vale o que ditam as convenções dos condomínios. Gabriel de Britto Silva, advogado da área imobiliária e sócio do escritório Brito e Lamego Advogados, diz que a autonomia dos condomínios é respaldada pela Justiça. Tanto no Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ) quanto no Superior Tribunal de Justiça (STJ), o entendimento predominante, afirma ele, é de que condomínios com destinação exclusivamente residencial podem estabelecer regras ou até impedir esse tipo de negócio. — A locação por temporada está prevista na Lei do Inquilinato, para contratos de até 90 dias. Já a locação por curta temporada intermediada por plataformas digitais é tratada como contrato de hospedagem, pois não há regulação legal direta e específica. Nesse caso, cabe ao condomínio disciplinar a prática — explica. Na Câmara do Rio, a discussão começou em março, com a criação de uma comissão especial para tratar do assunto. Em debates com casa lotada e protestos, chegou-se a propor a proibição do aluguel de curta temporada na orla — o que não foi adiante — e a criação de um cadastro dos locadores no município. No último dia 15 de dezembro, um relatório final da comissão foi aprovado, com medidas, para muitos, brandas. O documento recomendou a apreciação do tema em plenário e destacou ser necessário criar uma “legislação robusta”, de forma a garantir “a segurança dos condôminos, a isonomia fiscal e o ordenamento urbano”, evitando-se, por exemplo, a prática de eventual “atividade comercial hoteleira disfarçada”, além de deixar claras as responsabilidades de plataformas e anfitriões (como são chamados os administradores dos imóveis locados). Um projeto de lei tramita na Câmara sobre a atividade. O recesso parlamentar, no entanto, adiou as definições para 2026. Alta rotatividade No Edifício Costa do Atlântico, que proibiu a prática, o síndico Ayrton conta que as conversas foram longas, iniciadas antes mesmo de sua gestão, até que a decisão tivesse sido tomada, no início deste ano. Consenso, não houve. Até porque, segundo ele, os imóveis anunciados para curta temporada no prédio chegaram a representar cerca de 16% do total de apartamentos. Luis Fernando Guerrero, advogado da área de solução de conflitos do escritório Lobo de Rizzo Advogados, ressalta que, independentemente da decisão, é fundamental compreender o papel central da assembleia condominial no processo: — O condomínio é uma comunidade. A convenção e o regimento interno refletem a vontade da maioria. Por isso, é essencial que os condôminos discutam qual é o perfil desejado para o local. Segundo o especialista, a maioria dos conflitos decorre da alta rotatividade de pessoas, o que pressiona a estrutura dos condomínios. Nem todos os empreendimentos, alerta Guerrero, têm condições adequadas para controle de acesso e gestão das demandas típicas desse tipo de locação. Já sobre o impacto na economia da cidade, Alfredo Lopes, presidente do Hotéis Rio, diz que é possível a coexistência entre hotéis e imóveis ofertados em plataformas digitais, desde que haja regulamentação adequada: — O problema é o desequilíbrio. Do ponto de vista tributário, por exemplo, hotéis pagam impostos, tarifas comerciais e cumprem exigências de segurança. Os imóveis anunciados em plataformas não seguem as mesmas regras. Em nota, o Airbnb afirmou que se opõe a restrições que prejudiquem a economia local e reforçou que o aluguel por temporada é uma atividade legal. A empresa também informou que mantém diálogo com governos e incentiva boas práticas de convivência. Segundo a plataforma, o Rio é um dos destinos preferidos de seus usuários. Estudo de outra plataforma, a Booking.com, também indica que a cidade está em alta: é o destino mais procurado por viajantes brasileiros e estrangeiros para janeiro de 2026, com acréscimo de 12% nas buscas em relação ao ano passado.