Um ano após o pior acidente aéreo em solo sul-coreano, que deixou 179 mortos em 28 de dezembro de 2024, familiares de algumas das vítimas continuam acampados em barracas no segundo andar do Aeroporto Internacional de Muan. O protesto, mantido apesar das múltiplas investigações em curso, reflete a frustração com a falta de respostas conclusivas sobre as causas da tragédia. Investigação: Pilotos desligaram motor errado após colisão com aves antes de acidente Entenda: O que se sabe sobre o acidente com o avião que caiu na Coreia do Sul Representante das famílias das vítimas, Kim Yu-hin perdeu os pais e o irmão no acidente. — Eu me pergunto por que continuamos enfrentando as mesmas perguntas, sentindo a mesma tristeza e a mesma raiva repetidas vezes — disse em entrevista coletiva recente na cidade vizinha de Gwangju. Em 29 de dezembro de 2024, o voo 2216 da Jeju Air, procedente de Bangcoc, saiu da pista ao aterrissar em Muan, colidiu com um muro e explodiu. Apenas duas pessoas sobreviveram. Até hoje, contudo, permanecem lacunas relevantes na apuração do que provocou o desastre. As informações preliminares indicam que a aeronave colidiu com um bando de pássaros e realizou uma manobra de emergência antes de tocar o solo com a fuselagem, deslizando pela pista até atingir um talude de concreto. Avião explodiu com 181 pessoas a bordo em aeroporto na Coreia do Sul AFP O Conselho de Investigação de Acidentes Aéreos e Ferroviários — órgão governamental vinculado ao Ministério da Terra, Infraestrutura e Transportes e responsável pela principal apuração — divulgou poucos detalhes sobre suas conclusões. Tentativas de realizar coletivas de imprensa foram interrompidas por familiares das vítimas, que defendem a reestruturação do órgão, alegando falta de independência em relação ao ministério responsável pela aviação civil. Alertas ignorados Reportagens do The New York Times revelaram que autoridades ignoraram alertas prévios sobre os riscos representados por bandos de pássaros na região do aeroporto e sobre o perigo do muro de concreto ao final da pista. Após o acidente, o Ministério dos Transportes prometeu uma ampla revisão da segurança aérea, incluindo melhorias na infraestrutura de pistas em quase metade dos 15 aeroportos comerciais do país e o reforço das práticas de segurança de nove companhias aéreas de baixo custo. Segundo o ministério, parte das medidas foi implementada, como a ampliação das equipes de controle de vida selvagem e o uso de câmeras para detectar aves nas rotas de voo. Outras promessas, porém, seguem pendentes — entre elas a remoção e reconstrução, até o fim deste ano, dos taludes de concreto que abrigam equipamentos de navegação em pistas de sete aeroportos. Até quarta-feira, apenas os aeroportos de Pohang Gyeongju e Gwangju haviam concluído as obras. Em terminais com dois taludes, a previsão é que as reformas sejam finalizadas apenas no próximo ano, informou o ministério. No Aeroporto de Muan, as obras ainda não começaram. Um porta-voz do Ministério dos Transportes afirmou que a relação delicada entre a administração do aeroporto e as famílias das vítimas contribuiu para o atraso. Parentes dos passageiros mortos protestam há meses pela criação de um conselho independente, contratado e financiado pelo gabinete do primeiro-ministro, para conduzir a investigação. Segundo familiares e especialistas em segurança aérea, a medida aumentaria a credibilidade do relatório final e reduziria a percepção de conflito de interesses, já que as atuais autoridades investigam um acidente ocorrido em um sistema sob sua própria supervisão. Nas últimas semanas, o governo começou a atender parte das reivindicações. No início de dezembro, familiares acamparam em frente ao gabinete presidencial, em Seul, contra uma audiência prevista pelo conselho atual para divulgar conclusões preliminares. O evento acabou cancelado. Parentes de vítimas do acidente com avião da Jeju Air, na Coreia do Sul, diante dos destroços da aeronave YONHAP / AFP Ainda em dezembro, uma comissão permanente da Assembleia Nacional aprovou um projeto para criar o novo painel de investigação. A proposta precisa agora ser votada em plenário. — A independência é fundamental para investigações de acidentes — diz Kim, representante das famílias: — Esperamos que isso melhore a transparência na determinação da causa do acidente e a eficácia das recomendações de segurança para evitar que incidentes semelhantes voltem a acontecer. Especialistas dos Estados Unidos citam o exemplo do Conselho Nacional de Segurança nos Transportes (NTSB), que se tornou uma agência independente por lei em 1974, após inicialmente integrar o Departamento de Transportes. — Isso é absolutamente um passo à frente para melhorar a segurança de seus cidadãos e, de fato, do mundo como um todo — afirma Christopher Freeze, ex-investigador do NTSB. A eventual transição institucional pode deixar pontos da investigação temporariamente indefinidos, embora o trabalho técnico não tenha sido interrompido, segundo Kim Gihun, diretor-geral do conselho sul-coreano, que pode perder o cargo caso a nova lei seja aprovada. — No momento, há realmente coisas demais que são incertas — diz Kim.