Minhocas-zumbi “devoradoras de ossos” somem do fundo do mar e acendem alerta entre cientistas

Cientistas que monitoram o fundo do oceano no nordeste do Pacífico foram surpreendidos por um resultado inquietante: após uma década de observações, nenhuma “minhoca-zumbi” apareceu em ossos de baleia depositados propositalmente no leito marinho. A ausência do animal, conhecido formalmente como Osedax — ou “devorador de ossos” — levanta preocupações sobre os efeitos da perda de oxigênio nos oceanos e o possível colapso de ecossistemas associados às chamadas “quedas de baleia”. 'O que estamos fazendo vai além da astronomia', diz cientista brasileiro que ajuda a mapear céu do Hemisfério Sul Perspectivas 2026: Próximo ano deve manter sequência de calor extremo, oceanos instáveis e eventos severos O experimento de longo prazo foi conduzido por pesquisadores da Ocean Networks Canada (ONC) e da Universidade de Victoria (UVic), também no Canadá. Ossos de baleias-jubarte foram colocados a quase mil metros de profundidade no cânion Barkley, uma região naturalmente pobre em oxigênio e situada em rotas migratórias de baleias-jubarte e-cinzentas. Ao longo de dez anos, câmeras submarinas de alta resolução não registraram qualquer sinal de colonização por Osedax, apesar de o verme ser conhecido por se instalar rapidamente nesses restos orgânicos. “Esta foi uma observação notável em um experimento de tão longa duração”, afirmou Fabio De Leo, cientista sênior da ONC e professor adjunto do Departamento de Biologia da UVic, que liderou o estudo. Segundo ele, a ausência pode estar ligada aos níveis excepcionalmente baixos de oxigênio no local. As minhocas-zumbi desempenham um papel fundamental no fundo do mar. Elas não têm boca, ânus nem sistema digestivo. Sobrevivem perfurando os ossos com estruturas semelhantes a raízes, onde abrigam microrganismos capazes de extrair nutrientes. Por isso, são consideradas “engenheiras do ecossistema”, pois iniciam o processo de reciclagem de nutrientes e permitem que outras espécies colonizem os restos das baleias. Estudo afirma: Até 50% das praias no Brasil, Uruguai e Argentina correm risco de desaparecer até 2100 Quando uma baleia morre e afunda, seu corpo cria uma “queda de baleia”, evento que normalmente sustenta uma rica biodiversidade por anos, funcionando como uma espécie de oásis no fundo do oceano. Para De Leo, essas quedas são “quase como ilhas” e representam “um habitat de passagem para esta e muitas outras espécies especializadas em ossos de baleia”. A falta do Osedax sugere que a expansão das zonas de mínimo oxigênio (OMZs, na sigla em inglês), associada ao aquecimento global, pode estar interrompendo esse processo. Sem o verme para iniciar a decomposição dos ossos, menos organismos conseguem acessar os nutrientes armazenados, o que compromete toda a cadeia ecológica. “Basicamente, estamos falando de uma perda potencial de espécies”, alerta De Leo. As minhocas adultas vivem nos ossos, enquanto suas larvas se dispersam por centenas de quilômetros pelas correntes oceânicas em busca de novas quedas de baleia. Se esses habitats deixarem de funcionar, a conectividade entre eles se rompe, reduzindo a diversidade ao longo do tempo. O impacto não se limita às minhocas-zumbi. O estudo também identificou sinais de estresse em outro engenheiro do ecossistema profundo: os moluscos perfuradores de madeira do gênero Xylophaga. Embora presentes em amostras de madeira submersa no cânion Barkley, eles colonizaram o material em ritmo muito mais lento do que em áreas ricas em oxigênio, o que pode atrasar a decomposição do carbono e a formação de habitats para outras espécies. “Parece que a expansão das OMZs, que é consequência do aquecimento dos oceanos, será uma má notícia para esses incríveis ecossistemas de quedas de baleia e de madeira ao longo da margem nordeste do Pacífico”, disse Craig Smith, professor emérito da Universidade do Havaí e coautor da pesquisa. Os dados foram coletados por meio do observatório submarino NEPTUNE, da ONC, com apoio de sensores oceanográficos, câmeras fixas e veículos operados remotamente. Novos resultados são esperados nos próximos meses a partir do monitoramento de outra queda de baleia em um local diferente da rede NEPTUNE. A pesquisa contou com financiamento da Fundação Canadense para a Inovação e, em parte, da Fundação Nacional de Ciências dos Estados Unidos, além de estar alinhada ao Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 14 da ONU, voltado à proteção da vida marinha.