Medidas anunciadas pelos Correios são positivas, mas insuficientes para resolver crise da estatal, dizem especialistas

As medidas anunciadas nesta segunda-feira pelo presidente dos Correios, Emmanoel Rondon, para dar início a uma reestruturação da estatal deficitária vão na direção correta, mas são insuficientes para resolver as contas diante do prejuízo bilionário, afirmam especialistas. Com isso, para seguir no competitivo mercado de entregas logísticas, a privatização da operação — descartada pelo presidente Lula — seria incontornável. Veja os principais pontos: Plano de recuperação dos Correios prevê fechamento de mil agências e demissão de 15 mil funcionários Estatal monitorada: Tesouro considera 'bem-sucedida' primeira etapa para a reestruturação dos Correios e destaca economia de R$ 5 bilhões em juros — A percepção é de que as medidas vão na direção certa, mas não vão resolver o prejuízo, porque o problema é muito maior do que as economias propostas pelo plano. São números que, considerando uma estimativa de R$ 23 bilhões em prejuízo (em 2026), não farão frente (a isso) — afirma Armando Castelar, economista do Ibre/FGV. Com a previsão de fechar este ano com uma perda de R$ 10 bilhões e mais do que dobrar esse prejuízo em 2026, quando o resultado poderia ficar negativo em R$ 23 bilhões, os números anunciados no pacote para reorganizar a estatal — com previsão de corte de R$ 2,1 bilhões em despesas — sinalizam um efeito pequeno. Efeitos demorados E existe um complicador no planejamento dos Correios, destaca Castelar: as principais medidas anunciadas vão demorar a se concretizar. Isso ocorre porque o plano de demissão voluntária (PDV), que mira em desligar 15 mil empregados da estatal em dois anos, primeiro irá gerar um gasto adicional para, depois, resultar em economia, enquanto a venda de cerca de mil imóveis é um processo lento no setor público, explica ele. Para Claudio Frischtak, presidente da Inter.B Consultoria, as medidas não são apenas insuficientes, elas estão sendo adotadas com atraso. A participação dos Correios no mercado de entregas logísticas caiu de 51% para menos de 25%. Na visão do economista, o único caminho para os Correios é a privatização. Mega da Virada 2025: quanto custa apostar com 10 números e quais são as chances de ganhar A situação da estatal, diz ele, combina problemas de governança comuns às empresas públicas — devido à pressão política —, a forma como essa dificuldade leva a travas na gestão, os desafios de um mercado de alta concorrência, sendo ainda intensiva em mão de obra: — Os Correios atuam em um mercado altamente competitivo, que demanda agilidade. A empresa está quebrada. Houve uma gestão de recursos humanos muito falha, o governo passou pano numa situação calamitosa. E há um passivo contingente imenso — afirma Frischtak. — Sou muito cético de que qualquer plano de reestruturação possa ser levado adiante de forma íntegra começando em ano eleitoral e com a Justiça trabalhista leniente com empresas falidas. Custo alto para o caixa público O problema central está na demanda de caixa de R$ 20 bilhões. Deste total, foi feito um empréstimo de R$ 12 bilhões junto a cinco bancos, com garantia da União. Ainda assim, diz Rondon, a necessidade de Caixa dos Correios pediria outros R$ 8 bilhões. Esse aporte, porém, poderia vir de nova tomada de crédito, mas também de recursos do governo. — Qualquer aporte (atual ou futuro) deveria ser condicional a um plano consistente de reestruturação e redirecionamento estratégico — sublinha Sérgio Lazzarini, professor do Insper. — Em sendo uma estatal, é crucial também este governo repensar sua abordagem para as estatais e retomar uma postura mais atenta para a sua governança e gestão. Senão, qualquer plano de mudança estratégica pode não ser crível. Castelar lembra que os Correios foram retirados do programa de privatização do governo federal em 2023 e que a União está, agora, pagando a conta dessa decisão: Brasil é top 5 global: Bets ilegais são 40% do mercado, e setor vira alvo do governo na questão fiscal — Poderíamos estar poupando esse dinheiro que está sendo gasto agora, os Correios estavam na lista de privatizações. Era uma estatal lucrativa em 2021. O prejuízo mostra o impacto da interferência política — avalia ele. — Cogitar um aporte de R$ 8 bilhões vindo da União é um valor muito alto, relevante. O problema é que isso é recorrente. Mais à frente, vai precisar provavelmente de outros bilhões de reais. O caminho da privatização Os dois especialistas apontam a privatização com o a saída para os Correios. Na visão de Frischtak, a reestruturação terá de olhar para o presente dos Correios, mas principalmente para o passado, em razão do passivo contingente. O melhor, avalia ele, seria dividir a estatal em duas, sendo uma delas livre dos prejuízos, com o objetivo de ser privatizada: — Só faz sentido privatizar o que vem para frente, sem perpetuar o (prejuízo) para trás. Já a hipótese de uma parceria público-privada demandaria botar dinheiro público. Não faz sentido. Serviços hoje apontados como essenciais e deficitários, como o atendimento a localidades remotas do país, explicam os especialistas, poderiam ser todos mantidos se devidamente apontados na modelagem que teria de ser construída para a concessão dos Correios. — Isso foi feito no saneamento, na eletricidade, em telecomunicações. Tudo precisa estar na regulação, na modelagem criada para a privatização — conclui Castelar.