O ano de 2026 deve marcar um ponto de inflexão definitivo na relação entre inteligência artificial e mercado de trabalho. Após um ciclo intenso de experimentação com ferramentas de IA generativa - como chatbots, copilotos de código e sistemas de análise automatizada - empresas de diferentes setores entram em uma nova fase: a da aplicação prática em escala. Nesse cenário, a IA deixa de atuar apenas como suporte à decisão humana e passa a executar processos completos, com impacto direto sobre profissões baseadas em rotinas cognitivas padronizadas, fluxos digitais e tarefas repetitivas. Áreas como administração, atendimento ao cliente, finanças, indústria, saúde e pesquisa científica estão entre as primeiras a sentir os efeitos dessa transformação. A seguir, o TechTudo analisa quais setores e profissões serão mais impactados em 2026, como essas mudanças já estão acontecendo e quais habilidades tendem a ganhar valor em um mercado cada vez mais automatizado. IA coloca profissões de tecnologia em perigo? Veja o que pode acontecer Canal do TechTudo no WhatsApp: acompanhe as principais notícias, tutoriais e reviews Quais profissões serão mais impactadas em 2026 pela IA Imagem de enio por Pixabay Inteligência artificial é perigosa? Veja no Fórum TechTudo A consolidação da IA no mercado Em 2026, IA já será comum no mercado e não uma promessa sensacional imagem gerada pelo gemini Segundo projeções da Gartner, os gastos globais com inteligência artificial devem ultrapassar US$ 2 trilhões em 2026, o que reflete a transição das empresas da fase de testes para a implementação em larga escala. Para o professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) e especialista em tecnologias emergentes, Kenneth Corrêa, esse movimento não é apenas tecnológico, mas estrutural. “A grande mudança de 2026 não é apenas tecnológica, é estrutural: saímos de um modelo onde a IA sugere para um onde ela executa”, afirma. Essa virada redefine não apenas cargos específicos, mas a própria lógica de funcionamento das organizações, que passam a operar com o apoio de uma nova força de trabalho digital baseada em Redes de Agentes Inteligentes. A consolidação dessas redes inaugura o que especialistas chamam de era da autonomia operacional, na qual sistemas de IA são capazes de ler dados, tomar decisões, acionar outros sistemas e executar tarefas de ponta a ponta sem intervenção humana constante. Diferentemente dos copilotos atuais, que dependem de validação humana a cada etapa, os agentes autônomos operam de forma integrada, negociando orçamentos, resolvendo reclamações, otimizando cadeias produtivas e coordenando processos complexos em tempo real. Para o professor, essa mudança pressiona imediatamente profissões ligadas ao backoffice e ao atendimento de primeiro nível, transformando o papel do profissional humano. “Os agentes não apenas rascunham uma resposta de e-mail. Eles leem a reclamação, acessam o sistema de logística, autorizam a troca dentro da política da empresa e agendam a coleta, tudo sem intervenção humana direta”, explica. Nesse contexto, o trabalhador deixa de ser um operador de tarefas para se tornar um gerente de exceções, responsável por supervisionar múltiplos agentes e intervir apenas quando há necessidade de julgamento humano, empatia ou criatividade. Da era dos copilotos à autonomia operacional Agentes de IA devem substituir humanos em fluxos de trabalhos Alex Knight/Unsplash Até recentemente, a IA era vista como uma ferramenta de apoio. Em 2026, essa lógica muda de forma definitiva. De acordo com Kenneth, a autonomia dos agentes transforma a IA em uma verdadeira força de trabalho digital, capaz de assumir fluxos completos de trabalho. “Essa autonomia pressiona imediatamente funções de backoffice e atendimento nível 1”, afirma. O impacto é mais intenso em profissões baseadas em rotinas cognitivas previsíveis, especialmente nas áreas administrativa, financeira e de suporte ao cliente. Nessas funções, a IA deixa de ser um complemento e passa a operar como executora principal, reduzindo a necessidade de intervenção humana contínua. Setores mais impactados em 2026 pela IA Administração, atendimento e operações financeiras As primeiras áreas a sentir os efeitos da autonomia operacional são baseadas em fluxos digitais padronizados. Funções administrativas, atendimento ao cliente de primeiro nível e operações financeiras básicas estão entre as mais impactadas. “O profissional dessas áreas deixará de ser um operador de tarefas para se tornar um gerente de exceções”, explica Kenneth. Na prática, isso significa menos tempo gasto com execução repetitiva e mais foco em supervisão, análise de casos complexos e tomada de decisão estratégica. Auditoria, contabilidade e consultoria jurídica Em setores como auditoria, contabilidade e consultoria jurídica, a adoção de agentes autônomos muda profundamente o modelo de negócios. Segundo Kenneth, o maior risco não é a substituição imediata do profissional, mas a obsolescência do modelo baseado em horas faturáveis. “Tarefas que antes justificavam dezenas de horas de analistas juniores agora são executadas em minutos, com precisão superior”, afirma. Análises de risco conhecidas como due diligence, revisões contratuais em massa e cruzamento de balanços passam a ser realizados por agentes de IA, enquanto o valor do profissional humano se desloca para a interpretação estratégica e o julgamento ético. Nesse novo cenário, o advogado ou auditor de 2026 não é pago para encontrar a cláusula de risco, mas para decidir o que fazer com essa informação dentro do contexto do negócio do cliente. Indústria: robôs humanoides chegam ao chão de fábrica Na indústria, a grande novidade é a transição da IA Física (Embodied AI) do campo experimental para a operação comercial. Robôs humanoides começam a ser inseridos de forma cirúrgica em gargalos produtivos, especialmente onde há escassez de mão de obra. “Diferente dos braços robóticos fixos, esses humanoides navegam por espaços feitos para pessoas, assumindo tarefas de logística interna e manuseio repetitivo”, explica Kenneth. O impacto imediato não é a substituição em massa, mas a transformação do papel do trabalhador humano, que passa de executor físico para operador de frota robótica. Pesquisa científica e setor farmacêutico Na ciência e na indústria farmacêutica, agentes de IA já estão acelerando descobertas de forma inédita. A partir de 2026, o pesquisador humano assume um novo papel. “Ele deixa de ser o executor de tarefas manuais de bancada para se tornar o arquiteto da descoberta”, afirma Kenneth. Com agentes orquestrando fluxos completos de pesquisa - desde a análise da literatura até a condução de experimentos físicos - ciclos de desenvolvimento que antes levavam anos passam a ser comprimidos em semanas. Isso transforma laboratórios em estruturas de ciência em escala industrial, sem eliminar o papel humano na definição de problemas e validação final. Saúde: interfaces cérebro-computador e automação clínica Na saúde, o impacto mais imediato não está em promessas futuristas, mas em aplicações clínicas concretas. Segundo Kenneth, empresas como a Synchron estão mais avançadas do que projetos altamente midiáticos. “Em 2026, a transformação real será a devolução da dignidade para pacientes com limitações motoras severas”, afirma. Interfaces Cérebro-Computador permitem que pacientes controlem dispositivos e se comuniquem apenas com o pensamento, marcando o início de uma nova era na reabilitação neurológica. A infraestrutura que sustenta a IA madura A maturidade da IA exige mudanças profundas na infraestrutura tecnológica. Um dos pilares é a Edge AI, que processa dados localmente, sem a necessidade de enviá-los à nuvem. “A regra passa a ser clara: o dado não viaja, o modelo é que vai até ele”, explica Kenneth. Isso resolve dilemas de privacidade e segurança em setores sensíveis como saúde e indústria, além de reduzir latência e dependência de grandes data centers. Do modelo de busca ao comércio “bot-to-bot” Agentes de IA estarão mais presentes no trabalho Reprodução/LinkedIn Na relação entre consumidores e empresas, o modelo de busca dá lugar à delegação. Agentes pessoais de IA passam a negociar diretamente com agentes das empresas, criando um ecossistema conhecido como bot-to-bot. Para Kenneth, isso não elimina canais tradicionais, mas os complementa. “O atendimento humano não desaparece, mas se eleva a um patamar premium de relacionamento e empatia”, afirma. Profissionais de vendas e suporte passam a atuar como curadores de dados, garantindo que produtos e serviços sejam compreendidos pelos algoritmos dos agentes dos consumidores. Oportunidades e desafios para o Brasil O Brasil aparece como o terceiro maior usuário de IA generativa no mundo, segundo estudo da Semrush, mas ainda enfrenta adoção corporativa desigual. Para Kenneth, a vantagem competitiva do país está na camada de aplicação. “Em 2026, os setores financeiro e de varejo estarão na pole position dessa virada”, afirma, citando exemplos como bancos e grandes plataformas de e-commerce que já operam com estratégias AI-First. O agronegócio também surge como promessa, o que impulsiona investimentos bilionários em tecnologia até o fim da década. O maior risco: ficar parado É importante que funcionários continuem a aprendem para evoluir em empregos Reprodução/Freepik Para o especialista, o maior risco não está na adoção acelerada da IA, mas na resistência à mudança. “Nunca custou tão caro ser o último a chegar”, afirma. Operar em 2026 com mentalidade e ferramentas de 2019 deixa de ser conservador e passa a ser uma ameaça existencial. Na prática, essa resistência cria um déficit de produtividade difícil de reverter. Organizações que já operam com Redes de Agentes Inteligentes conseguem reduzir custos, acelerar decisões e escalar operações em um ritmo impossível para estruturas baseadas apenas em processos manuais. Esse abismo tende a se ampliar rapidamente, tornando cada vez mais difícil para quem ficou para trás recuperar competitividade apenas com investimento financeiro. As habilidades humanas mais valorizadas em 2026 Ao contrário do discurso de que apenas soft skills sociais serão relevantes, Kenneth aponta uma valorização crescente de habilidades analíticas e de gestão de projetos. O profissional mais valioso será o orquestrador de fluxos, capaz de dividir problemas complexos, delegar tarefas à IA e exercer julgamento crítico sobre os resultados. “Deixamos de ser avaliados pelo volume do que produzimos com as mãos e passamos a ser valorizados pela qualidade das perguntas que fazemos”, conclui. Saiba mais Veja também: Como você explicaria a IA para crianças? Estagiário Pergunta!! Como você explicaria a IA para crianças? Estagiário Pergunta!!