Samarco recupera licença de projeto de mineração no mesmo local da tragédia de Mariana

Nesta terça (30), o Tribunal Regional Federal da 6ª Região derrubou a decisão judicial que suspendia a licença ambiental do Projeto de Longo Prazo da mineradora Samarco, em Minas. Com isso, a mineradora volta a ter o direito de ampliar a instalação de barragens, pilhas de rejeito, e a extração mineral no mesmo complexo onde ficava a barragem de Fundão, cujo rompimento resultou na tragédia de Mariana (MG), há 10 anos. Relatório: Conflitos por causa de mineração afetaram mais de 1 milhão de pessoas no ano passado ‘Redoma de calor’: entenda os fenômenos climáticos que anteciparam o auge do verão no Sudeste do Brasil Polêmica em Pernambuco: Barraca envolvida nas agressões a casal de turistas em Porto de Galinhas é interditada por prefeitura Há um mês, a juiza Patricia Alencar Teixeira de Carvalho havia determinado, em primeira instância, a realização de estudos complementares sobre análises de risco, vulnerabilidade e adaptação climática, para o empreendimento ser liberado. Na sua decisão, ela mencionou as mudanças climáticas e o novo cenário de previsão de chuvas e situação de risco na região. Mas agora o Tribunal Regional Federal da 6ª Região suspendeu os efeitos dessa decisão , restabelecendo a validade da licença ambiental concedida pelo governo. Segundo o Tribunal, não houve indícios de irregularidades e o processo de licenciamento atendeu às regras. A necessidade de estudos complementares sobre temas climáticos podem ainda acontecer no procedimento administrativo ambiental, de forma técnica, diz o novo despacho. Após a decisão, a Samarco informou que as suas operações continuam normalmente e que "seguirá colaborando com os órgãos ambientais e cumprindo todas as condicionantes aplicáveis, mantendo seu compromisso com a segurança, a responsabilidade socioambiental e a transparência". Entenda a polêmica A mineradora Samarco, que era a responsável pela barragem do Fundão, foi autorizada pelo governo de Minas Gerais a ampliar sua atividade no chamado Complexo Minerário Germano, localizado entre as cidades de Mariana e Ouro Preto. A licença ambiental foi concedida em julho desse ano, mas logo foi contestada, na justiça, por moradores de Bento Rodrigues — distrito de Mariana devastado pela tragédia de 2015 — representados por advogados do Instituto Cordilheira. Na sentença de novembro, que pela primeira vez paralisava um projeto de mineração por riscos de extremos climáticos, a juiza federal Patricia Alencar Teixeira de Carvalho destacou que o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) apresentado no processo incluía dados históricos de precipitação, "ignorando a necessidade de integrar cenários futuros de mudanças". O Ministério Público Federal também foi favorável à suspensão da licença. "O licenciamento em referência envolve atividade com riscos extremos (ponderáveis e imponderáveis), sendo altamente recomendável a realização de todos os estudos que possam (hipoteticamente) apontar alguma vulnerabilidade futura", dizia a sentença. 'Marco da justiça climática' Os moradores da região alertam que o regime de chuvas hoje já é muito diferente de 10 anos atrás, e se preocupam com o risco da barragem de rejeiros não estar segura sem a devida avaliação do novo cenário climático. Monica Santos, moradora de Bento Rodrigues, também criticou o fato do processo de reparação pela tragédia de Mariana ainda não ter sido concluído. -- A suspensão da licença é uma conquista diante de um crime que segue sem reparação. Quem destruiu vidas e territórios não pode avançar sem garantir a não repetição. Os estudos apresentados ignoram as ações de enfrentamento à crise climática e os riscos que ela impõe, tratando o licenciamento como mera formalidade. No processo, a Samarco alegou que a paralisação desse empreendimento poderia comprometer as reparações do caso de Mariana, por questões financeiras. Além disso, a empresa também argumentou que as fases críticas de operação (disposição de rejeitos) só se iniciam entre 2029 e 2030.