Nasci no Rio de Janeiro, em São João de Meriti, no bairro Vila Tiradentes, na comunidade da Caixa d’Água, ali na conexão com o Chapadão. Minha vida na infância foi difícil. Não vou falar sofrida, porque o sofrimento é muito pesado, mas às vezes não tinha um alimento para mim e para minha família. Na janta, ou era só pão, ou só arroz e feijão. Minha casa dava vergonha. Estava quase caindo. Tinha rachaduras nas paredes, e quem estava de fora conseguia ver o interior. Quando eu era pequeno, só jogava bola e estudava. Meus pais me davam todo o suporte para eu estudar. Fui ficando mais velho e, com 16, 17 anos, percebi que ia ser difícil virar jogador e decidi ajudar meu pai e minha mãe dentro de casa. Eu também gostava de sair, e meus pais não tinham dinheiro para me dar. Foi aí que botei na cabeça que eu queria ter meu próprio dinheiro, para comprar minhas coisas e para ajudá-los. Comecei a vender doce na rua. Eu andava muito nessa época. Comprava mercadoria no Mercadão de Madureira, aí pegava a Intendente Magalhães e ia até o quartel lá no final, e voltava para o Mercadão. Comprava mais mercadoria e subia andando no sentido do Anil. Passava por Campinho, Tanque, Taquara e Freguesia. Quando comecei a vender as mercadorias, eu ainda treinava futebol. Nessa época, eu jogava no Ação, um time da Série C do Rio de Janeiro. Treinava de manhã, saía do treino, pegava o trem para descer no Mercadão de Madureira, comprava minha mercadoria e ia trabalhar vendendo na rua. Entrava em bar, restaurante, parava todo mundo. Teve época que eu não treinava; então, eu acordava às sete horas da manhã e só parava às seis da noite. Pegava dinheiro emprestado para comprar as mercadorias e devolvia depois. Era eu e mais três amigos, que ajudo até hoje. Mando um dinheiro para eles e, sempre que vou ao Brasil, faço um churrasco com eles. A gente comprava o que estava em promoção. No frio, por exemplo, a gente vendia mais chocolate. Quando estava muito sol, a gente vendia cookies da Bauducco ou balas da Mentos. Janderson e os amigos vendendo bala na rua Arquivo pessoal Última tentativa Eu ficava cansado, mas era o que tinha. Tirava uns cinco mil reais por mês vendendo doce. Trabalhava de segunda a sexta. Sábado e domingo eram meu lazer. Se botar na ponta do lápis, eu fazia R$ 400, R$ 500 por dia. É sofrimento. Às vezes tu ouve um não, às vezes desanima, mas isso é um processo. Com esse dinheiro, eu ajudava em casa, comprava roupas, saía. Ajudava meus pais e meus três irmãos. Isso durou uns quatro anos. Até eu viajar para São José de Ribamar, no Maranhão, para jogar o Campeonato Maranhense pelo São José. Isso graças ao meu empresário, que conheci em 2019, quando ainda vendia doce. Antes, ele me levou para Angra dos Reis e para o Duque de Caxias, mas nada estava dando certo. Quando eu voltei a vender minhas mercadorias, ele me ligou e falou que tinha uma oportunidade para jogar no São José. Eu orei, pedi a Deus e falei: “Deus, essa aqui é a minha última tentativa. Entrego tudo nas suas mãos”. Fui vice-artilheiro do Maranhense, chamei a atenção do Bahia de Feira. Foram sete gols em 15 partidas pela equipe baiana na Série D do Brasileirão. Aí as coisas começaram a andar. Chance de Luís Castro Apareceram propostas da Ponte Preta e do Botafogo. Aí eu decidi ir para o sub-23 do Botafogo. Dei um passo atrás, me dediquei e sabia que ia subir para o profissional. E não deu outra. Cheguei para disputar o Brasileirão de Aspirantes, mas fomos eliminados antes mesmo da minha estreia. Fiquei só disputando amistosos. Em um contra o Audax, em que eu fiz três gols, o Luís Castro estava olhando o jogo e me subiu para o profissional. Foi aí que minha vida andou. Janderson ao assinar contrato com o Botafogo Reprodução/Twitter Foi uma alegria enorme porque ninguém mais acreditava que eu ia virar jogador. Nem eu mesmo. Era a minha última tentativa. Eu não acreditava que a minha vida ia mudar assim de uma hora para a outra. Se eu não fosse jogador, talvez eu tivesse até mesmo entrado para a vida errada, pelas dificuldades. Mas eu tive muita sabedoria; mesmo tendo dificuldade, eu sempre tinha em mente que não ia fazer coisas erradas. Por isso, Deus olhou para mim e me abençoou, porque sempre fui coração bom e todo mundo gosta de mim pela pessoa que eu sou. Desde pequeno, eu sempre ajudei, buscava ajudar as pessoas de alguma forma. Ajudava uma mulher com uma bolsa pesada, por exemplo. Hoje em dia, eu estou podendo ajudar todo mundo lá na minha comunidade. Todo ano, eu faço festa para as crianças, distribuo ovo de Páscoa, cesta básica... Hoje eu penso em terminar meus estudos, que eu parei no primeiro ano do ensino médio, e quero fazer uma faculdade de educação física. Quando eu parar, quero continuar no futebol. *Em depoimento a Breno Angrisani