Os 10 melhores lançamentos editoriais de 2025

Como é de praxe, todo final de ano faço uma seleção dos melhores lançamentos do mundo editorial nacional. E este ano não será diferente. Em 2025, tivemos muitos bons lançamentos que merecem nossa indicação e resumo, com o fim declarado de instigar você, caro leitor desta coluna, a despender um pouco de tempo e dinheiro para fomentar sua inteligência, cultura e, quiçá, a criação de uma biblioteca pessoal — pense com carinho nisso para 2026. Aliás, permitam-me uma anedota: certo dia, enquanto caçoava em aula sobre como se tornou caro manter-se fiel à nova estética vestuária dos influencers de Instagram, um aluno afrontoso me perguntou, com ironia, quanto havia custado montar minha biblioteca de cerca de oitocentos livros — já são cerca de mil hoje. Respondi ao provocador que muito menos do que me custaria não tê-la; infinitamente menos do que me custaria não ser um leitor; incomparavelmente menos do que me custaria atravessar a vida inteira aprisionado na mesquinharia de uma existência sem livros. E esta é a mensagem que venho carregando há cerca de dez anos, e é por isso que fiz do “indicar livros” uma missão prazerosa. Top 10 lançamentos do ano Vamos à lista: Terapia ruim: Por que as crianças não amadurecem , de Abigail Shrier (Auster) O livro argumenta que as taxas de sofrimento mental entre crianças e adolescentes da geração atual estão aumentando apesar — e, em parte, por causa — da crescente medicalização e psicologização da infância. Shrier sustenta que a cultura contemporânea de saúde mental tende a superdiagnosticar e supermedicar comportamentos infantis, transformando frustrações e desafios normais em sinais de transtornos clínicos, e que isso pode reforçar uma visão de fragilidade em vez de resiliência. A autora baseia-se em entrevistas com profissionais de saúde mental, pais, professores e jovens para mostrar como certas abordagens terapêuticas têm efeitos colaterais significativos e benefícios questionáveis, e como a educação socioemocional e a conversa terapêutica podem, paradoxalmente, enfraquecer a capacidade das crianças de lidar com dificuldades naturais da vida. + Leia mais notícias de Cultura em Oeste Shrier — autora do também excelente Dano Irreversível — critica ainda a tendência de rotular comportamentos normais como patológicos e o uso excessivo de medicamentos, propondo que esse “cuidado” exagerado pode estar contribuindo para que crianças não desenvolvam independência, autonomia e capacidade de enfrentamento. Em vez de demonizar a terapia em si, ela sugere uma abordagem mais criteriosa e equilibrada, que priorize a construção da resiliência e permita que os jovens enfrentem frustrações e desafios de forma construtiva. A autora vê na cultura terapêutica difundida — tanto na escola quanto na família — um fator que pode estar impedindo o amadurecimento natural das crianças. Autópsia do Feminismo , de Débora Luciano (Ed. Caravelas) Autópsia do Feminismo parte da ideia provocativa de que “o feminismo como movimento histórico chegou ao fim” ou entrou em crise profunda — e a obra se propõe a dissecar esse fenômeno com rigor filosófico e simbólico. Débora Luciano traça uma análise das origens e contradições do pensamento feminista, ligando as reivindicações por direitos à dissolução da identidade feminina no discurso de gênero — o famigerado identitarismo. Em vez de repetir diagnósticos sociológicos convencionais, ela investiga as bases metafísicas do feminismo , especialmente a tensão entre corpo e transcendência, explorando como essa estrutura levou ao que a autora identifica como um esgotamento do movimento. O livro percorre momentos-chave da história do feminismo e dialoga com obras e autoras clássicas e contemporâneas para sustentar essa reflexão crítica. Luciano explora temas muitas vezes negligenciados por outras análises: maternidade, carne, papel do simbólico e figuras como a da Virgem, propondo que o movimento chegou a um ponto em que, ao tentar superar a condição feminina tradicional, acabou por dissolver — ou comprometer — aquilo que definia como “a mulher”. A autora evita simplificações e panfletarismos, buscando abrir espaço para repensar o que resta da mulher depois que o feminismo “venceu” — e, segundo ela, por isso mesmo se desfez. Trata-se de uma obra que propõe não apenas um exame histórico, mas também uma reconstrução crítica da identidade feminina e das narrativas que moldaram o feminismo ao longo do tempo. Suttree , de Cormac McCarthy (Alfaguara) Suttree é um romance de Cormac McCarthy publicado em 1979 — e jamais lançado no Brasil até o ano passado — que acompanha a vida de Cornelius Suttree, um homem que, em um ato de ruptura com sua origem social e familiar, decide viver à margem da sociedade na franja rural e urbana de Knoxville, Tennessee, nas décadas de 1950. Suttree abandona uma vida burguesa para morar em um barco no Rio Tennessee, buscando uma existência mais autêntica, longe das convenções. Ao longo da narrativa, ele se conecta com um grupo de marginalizados — pescadores, alcoólatras, prostitutas, doentes e párias sociais — em uma série de episódios que misturam humor ácido, miséria profunda e experiências quase míticas. O romance rejeita uma trama convencional de progressão e fechamento, preferindo uma textura narrativa que registra, com precisão quase etnográfica, os detalhes do mundo dos excluídos e o fluxo das relações humanas em contextos de miséria, traição, degradação, certa camaradagem e também violência. Do ponto de vista estilístico, Suttree é uma obra singular de McCarthy: sua prosa é rica em descrição, densamente poética e, ao mesmo tempo, áspera, capturando a crueza da vida cotidiana e as indiferenças da natureza humana. McCarthy não oferece soluções fáceis nem redenções claras; em vez disso, expõe a beleza trágica e grotesca da experiência humana nos confins sociais, onde a dignidade e o desespero coexistem de forma paradoxal. A ausência de uma narrativa convencional reflete a filosofia subjacente do romance — a vida não é uma história arrumada, mas um emaranhado de encontros, perdas e sobrevivências improvisadas. Suttree é frequentemente lido como uma meditação sobre a alienação, a busca por autenticidade e a persistência da humanidade em ambientes hostis, o que o torna uma das obras mais profundas e comoventes de McCarthy fora de sua famosa trilogia do oeste. A Pérola , de John Steiback (Record) A Pérola narra a história de Kino, um humilde pescador indígena que vive com sua mulher, Juana, e o filho Coyotito em uma vila costeira do México. A descoberta inesperada de uma pérola gigantesca — “a Pérola do Mundo” — desperta nele a esperança de uma vida melhor: educação para o filho, dignidade social e libertação da miséria. No entanto, à medida que a notícia se espalha, a pérola passa a atrair ganância, violência e traição. Aquilo que parecia um dom transforma-se gradualmente em maldição, revelando como a cobiça e a degradação moral dos homens contaminam até os sonhos mais legítimos. Leia também: "Economia do livro: setor editorial registra mais de 54 mil empresas no Brasil em 2025" Steinbeck constrói a narrativa como uma fábula moral, simples na forma e profundamente simbólica no conteúdo. A pérola representa tanto a promessa do progresso quanto sua capacidade de corromper, expondo como forças externas — colonização, exploração e escolhas morais equivocadas — moldam o destino dos indivíduos. Com linguagem direta e ritmo quase bíblico, o autor apresenta uma crítica severa à ilusão de ascensão econômica dissociada de uma coerência moral, sugerindo que certos sonhos, quando impostos por uma lógica de poder e ganância, conduzem não à libertação, mas à perda da inocência e à destruição daquilo que se pretendia proteger. A nova edição da Record é, na realidade, uma reedição da obra clássica, agora com nova tradução de A. B. Pinheiro de Lemos, seguindo o padrão gráfico das recentes publicações do autor pela mesma editora. A Nova Ciência Política , de Eric Voegelin (Vide Editorial) Trata-se de uma das obras mais influentes do filósofo político Eric Voegelin, originalmente publicada em 1952 como uma introdução ao que ele via como a necessidade de repensar a teoria política moderna à luz de tradições intelectuais mais profundas. O livro problematiza a crise teórica da ciência política de seu tempo, criticando o domínio do positivismo — que separa política de filosofia e de questões existenciais fundamentais — e propondo uma reconciliação entre política, história e filosofia. Voegelin explora a ideia de que muitas das “novas” ideologias políticas modernas, inclusive as estruturas totalitárias, podem ser compreendidas como expressões de um “gnosticismo” secularizado, no qual se busca uma salvação imanente na terra, em vez de reconhecer a transcendência que funda a ordem social e a ação política legítima. https://www.youtube.com/watch?v=_7Vft_49acs&list=PLa6ZAwmKhIlpxLblbh6SZhhEg1r3rgf_p&index=4 A nova edição brasileira, publicada pela Vide Editorial, traz o texto em boa tradução, acompanhada de uma apresentação contextual que destaca a probidade intelectual de Voegelin e sua coragem em desafiar tanto o regime nazista quanto o positivismo acadêmico dominante no pós-guerra, inclusive no meio universitário norte-americano. O livro permanecia sem edição no país desde 1979, quando fora lançado pela Editora da UnB. O prefácio da nova edição enfatiza, de modo preciso, a dimensão moral e científica da obra, ressaltando que o método de Voegelin — buscar a verdade independentemente das pressões ideológicas — é central para compreender sua crítica à ciência política convencional e sua proposta de recuperação de uma abordagem mais rica e filosoficamente enraizada do fenômeno político. A Biblioteca do Censor de Livros , de Bothayna Al-Essa (Editora Instante) A Biblioteca do Censor de Livros é uma distopia satírica que acompanha a jornada de um censor oficial em um regime totalitário no qual o governo controla rigidamente a literatura — e, por extensão, o pensamento. Durante o dia, ele revisa manuscritos em um escritório estatal, buscando qualquer indício que torne uma obra “imprópria” para publicação, como alusões à homossexualidade, religiões não autorizadas ou referências à vida anterior à Revolução. À noite, personagens de clássicos literários invadem seus sonhos, e os romances que secretamente surrupia acumulam-se em sua casa, conduzindo-o a um conflito interno entre sua função oficial e sua atração pela leitura proibida. Paralelamente, ele descobre um mundo subterrâneo de resistência, com livrarias clandestinas e bibliotecários fora da lei lutando para preservar a história e a cultura em meio à vigilância onipresente do Estado. Leia também: "Os livros que Bolsonaro pode ler para remição da pena" A obra é também uma declaração de amor à literatura e ao ato de ler, destacando como os livros — mesmo proibidos — são capazes de moldar identidades, despertar a imaginação e fomentar resistência cultural. Ao acompanhar a transformação do protagonista, de executor da censura a leitor apaixonado e cúmplice de uma rede de resistência, Bothayna Al-Essa constrói uma crítica contundente à vigilância estatal, ao controle ideológico e às formas contemporâneas de supressão do pensamento crítico. A narrativa funciona como um alerta sobre a ameaça global à liberdade intelectual e uma reflexão sobre o valor dos livros como guardiões da memória e da experiência humana. A edição brasileira, lançada em 2025 pela Editora Instante, traz essa fábula política ao público lusófono, ressaltando sua atualidade e urgência num contexto global de debates sobre censura e liberdade de expressão. Dentes de Ouro , de Douglas Lobo (Danúbio) Eis um romance brasileiro que mistura suspense, horror e elementos folclóricos no cenário do sertão piauiense , onde a pequena cidade de Santa Fé é assolada por ataques de javalis selvagens e violentos, liderados por uma criatura lendária conhecida como o “Dentes de Ouro”. A chegada de Firmino Herculano, um zootecnista com um passado conturbado que tenta escapar de suas próprias falhas, desencadeia uma série de eventos que expõem não apenas o perigo físico representado pelos animais, mas também as tensões internas da comunidade. Personagens como Everardo, um caçador mutilado; Aurora, presa a um casamento desfeito; e Venâncio, tomado pela inveja, formam um mosaico humano em que medo, superstição e ressentimento corroem as relações sociais. Narrado com um estilo direto e visceral, o livro combina uma atmosfera de thriller rural com reflexões sobre crenças populares, violência e relações humanas sob pressão extrema. A lenda do Dentes de Ouro funciona como um símbolo ambíguo de medo e obsessão, infiltrando-se tanto na prática cotidiana quanto no imaginário coletivo da comunidade. Embora a ação seja tensa e envolvente — típica de um suspense que mantém o leitor atento —, a obra também investiga como a linha entre homem e fera pode se tornar indistinta, sobretudo quando a sobrevivência se torna imperativa e a paranoia se intensifica. Ucrânia: Diário de uma Guerra , de Andrei Kurkov (Carambaia) Trata-se de uma obra de não ficção em que o escritor ucraniano Andrei Kurkov registra, em forma de diário, suas experiências desde os meses que antecederam a invasão russa em fevereiro de 2022 até os desdobramentos mais recentes do conflito. Ele abandona a ficção para documentar sua vida e a de sua família em meio à guerra, narrando episódios como os ataques a Kiev, a fuga de civis e a rotina em um país sob bombardeio. A obra intercala o relato pessoal com observações sobre a cultura, a história e as tradições ucranianas, oferecendo uma perspectiva humana e íntima de como a guerra transforma a vida cotidiana e a consciência nacional de um povo. Leia também: "De ficção a crise climática: Bill Gates divulga os 5 livros favoritos de 2025" A edição brasileira, publicada pela Carambaia, reúne registros escritos ao longo de mais de dois anos e inclui um epílogo exclusivo, contextualizando ainda mais a experiência de Kurkov e suas reflexões sobre identidade, resistência e esperança em tempos de guerra. O autor, reconhecido internacionalmente por seus romances e por sua prosa perspicaz, muitas vezes irônica, usa sua voz singular para captar tanto a brutalidade dos combates quanto os pequenos gestos de solidariedade e resiliência entre os ucranianos. O livro configura-se como um testemunho documental profundamente humano, que ultrapassa análises geopolíticas tradicionais ao enfatizar a dimensão cultural e emocional do conflito. Da Palavra ao Medo , de Dennys Garcia Xavier (LVM Editora) Uma obra profunda que analisa, sob uma perspectiva filosófica, a tensão entre liberdade de expressão e os limites que as sociedades contemporâneas — especialmente as democracias progressistas — impõem a essa liberdade. Dennys Xavier explora as bases conceituais da ideia de expressão livre, remontando a tradições filosóficas clássicas e iluministas, e contrapõe essas tradições às formas modernas de restrição discursiva, incluindo censura estatal, pressões sociais e práticas de cancelamento. O autor argumenta que a retórica em torno de segurança, respeito e proteção de grupos vulneráveis tem sido frequentemente utilizada para justificar a supressão de opiniões divergentes, colocando em risco o núcleo democrático da liberdade de pensamento e do debate público. Xavier critica tanto posturas autoritárias que buscam controlar a esfera pública por meio da legislação quanto tendências "progressistas" que, segundo ele, adotam práticas de intolerância discursiva sob o pretexto de emancipação social. O livro propõe que a verdadeira defesa da liberdade de expressão exige não apenas garantias legais, mas também uma cultura pública pluralista e resiliente, capaz de tolerar ofensas e divergências sem recorrer à violência simbólica ou à exclusão social. Trata-se de uma obra situada no cruzamento entre filosofia política, teoria do discurso e crítica cultural, oferecendo não apenas uma análise dos desafios contemporâneos, mas também uma reflexão consistente sobre como preservar o debate livre como valor essencial da vida democrática. O Polonês , de J.M. Coetze (Companhia das Letras) O Polonês é um romance de forte teor autobiográfico em que J. M. Coetzee reconstrói a vida de seu pai, Charles Coetzee, um imigrante polonês que chega à África do Sul antes da 2ª Guerra Mundial. A narrativa mescla fato e ficção ao explorar a trajetória de um homem marcado pela instabilidade familiar, pelas dificuldades da imigração e pela sensação persistente de deslocamento. Ao longo do livro, o autor retrata as aspirações frustradas e os silêncios de um homem comum que tenta encontrar sentido em um país atravessado por profundas tensões raciais e sociais. O romance também funciona como uma investigação sobre identidade, memória e linguagem. Coetzee escreve a partir da perspectiva do filho e do escritor, examinando como a vida de seu pai foi moldada por forças históricas que ultrapassavam sua compreensão imediata. A prosa contida e reflexiva evidencia a tensão entre a interioridade do personagem e as exigências do mundo exterior. Mais do que uma biografia ficcional, O Polonês é uma meditação sobre pertencimento, herança e o modo como as histórias individuais se inscrevem em processos históricos mais amplos, confirmando a maturidade literária e filosófica de um dos maiores escritores contemporâneos. Leia também: "O mercado editorial descobre a direita" , reportagem de Anderson Scardoelli publicada na Edição 286 da Revista Oeste O post Os 10 melhores lançamentos editoriais de 2025 apareceu primeiro em Revista Oeste .