"Terei menos tempo de vida?” “Vou morrer?”. Essas foram as primeiras perguntas que a modelo e empresária Carol Ribeiro fez ao neurologista Rodrigo Thomaz, do Hospital Albert Einstein, em São Paulo, ao descobrir o diagnóstico de esclerose múltipla, em abril do ano passado. Até então, a jornada tinha sido longa e dolorida: sintomas como visão turva, braço esquerdo que não obedecia aos comandos, fadiga extrema, calorões e passadas mais lentas em desfiles, em crises que iam e voltavam, a atormentavam há dois anos. “Algumas coisas acontecem para te acordar e dar um recado, que é: observe-se mais, escute seu corpo. A vida não é só trabalho”, diz ela, durante duas horas de entrevista, no escritório da Prime Mgmt., agência de modelos da qual é sócia, na capital paulista. É comum que a doença, crônica, e que atinge o sistema nervoso central, prejudicando os movimentos e a fala, seja confundida com outras condições; no caso da top paraense, as suspeitas eram, inicialmente, de uma possível entrada na menopausa e síndrome do pânico. “Não é um diagnóstico rápido. Sou a louca do estudo, de querer entender tudo, e sempre fui mais objetiva. A realidade é essa? O.k., vamos trabalhar com o que temos para não sofrer depois. Mas quando você ouve esclerose múltipla, é um baque.” Vestido e luvas Cris Barros, colar Swarovski, meia-calça Calzedonia e sapatos Birman Gustavo Ipolito Aos 45 anos e 30 de carreira, com trabalhos para grifes como Louis Vuitton, Gucci, Saint Laurent e Balmain e incursões nas coberturas do tapete vermelho do Oscar pelo canal TNT, Carol despertou para um novo recomeço. A doença, entendeu, não é uma sentença de morte ou de uma má qualidade de vida. Com o apoio irrestrito do marido, o publicitário Paulo Lourenço, de 54 anos, e do filho, João, de 21, ela iniciou o uso de imunomoduladores, medicação injetável aplicada de 6 em 6 meses para frear o avanço da esclerose múltipla. Incluiu os exercícios físicos na rotina de forma definitiva e mudou a alimentação, cortando em 100% os industrializados. E, o principal: olhou para dentro e deu uma chance à terapia pela primeira vez. “Nunca achei que precisasse. Mas mudou minha percepção de algumas coisas. A gente precisa se permitir ser vulnerável e mais positiva”, garante. Um ano e meio após o diagnóstico, como você está se sentindo? Tomei a terceira dose do imunomodulador em junho e estou muito bem. É uma adaptação. A esclerose múltipla tem muitos sintomas, e eu tive um pouco de todos, mas não deixaram sequelas. A hipótese é que eu tenha tido duas grandes crises, uma em 2015 e outra em 2023. Quais foram esses sintomas? Há dez anos, senti que não controlava os movimentos do braço esquerdo. Quebrei muitos copos, “me batia” ao lavar o cabelo. Em exames de imagem, o médico acreditou ser consequência de um acidente de carro que sofri aos 17 anos quando morei no Japão. Fiz três meses de fisioterapia e passou. Em agosto de 2023, correndo na orla, em Miami, perdi a noção de espaço e tive um cansaço estranho, a visão turva. Depois, fiquei 17 dias sem dormir direito, suava, sentia um calorão. Suspeitei de síndrome do pânico e talvez o início da menopausa, porque as crises pioravam perto do período menstrual. Vestido Isabel Marant, colar Cartier, luvas Minha Avó Tinha, e meia-calça Calzedonia Gustavo Ipolito Viveu uma via crucis de médico em médico? Primeiro, fui ao ginecologista, e as minhas taxas hormonais estavam normais. Depois, um endocrinologista me passou remédios para a tireoide. Conversando com a (médica e modelo) Ana Claudia Michels, de quem sou muito amiga, ela disse para eu não tomar nada disso, porque não tinha nada na tireoide. Voltei ao ginecologista, e ele falou que eu precisava parar, escutar meu corpo. Aí, me encaminhou para um neurologista. Após muitos exames, o diagnóstico veio em abril do ano passado. Estudos dizem que a menopausa pode afetar mais as mulheres com esclerose múltipla. Já procurou tratamento hormonal? Os níveis de estrogênio, hormônio que ajuda a regular o sistema nervoso e imunológico, diminuem na menstruação e na menopausa. Por causa da doença, tenho muito mais os sintomas. Comecei um tratamento com implantes hormonais e ainda estamos em fase de ajustes, mas, em 40 dias, voltei a ser a Carol de antes, bem melhor, tipo “Mulher Maravilha”. Foi duro falar publicamente do assunto? Falei sobre a doença em um evento em abril deste ano, e as pessoas ficaram em choque. Mas já era algo resolvido para mim, então, não. É preciso desmistificar a esclerose múltipla como uma coisa que te incapacita. Estou conseguindo conviver com ela, mas sei que tenho privilégios. A medicação que você toma custa 200 mil reais por dose. O acesso foi difícil? A autorização do plano de saúde demorou 17 dias, mas pareceu muito mais. Tem quem esteja batalhando há um ano, só que tudo depende de como o médico faz o laudo. É possível conseguir o remédio pelo SUS, mas o que complica é receber o diagnóstico certeiro. Camisa Burberry na Trash Chic, luvas Cris Barros e pulseira Swarovski Gustavo Ipolito O que mudou na sua rotina? Evito álcool, embutidos, não posso comer nada cru ou mal passado e evito alimentos industrializados. No geral, estou mais saudável do que antes, porque me alimento melhor e incluí os exercícios físicos na rotina de forma definitiva. A doença te fez procurar terapia? Sim. Nunca havia feito, era cética, pensava que ninguém resolveria meus problemas. Mas é interessante porque abre caminhos, organiza os pensamentos. Sempre fui mais objetiva e realista, e a gente precisa se permitir ser vulnerável e mais positiva. Pensar que, sim, as coisas vão dar certo. Você e Paulo estão casados há 29 anos. Como ele ajudou você a lidar com tudo isso? Paulo é meu porto seguro. Todo mundo precisa ter o privilégio de ter alguém com quem possa ser vulnerável. Não gosto de ninguém me amansando ou dizendo “coitadinha da Carol”. Mas se tem alguém que pode fazer isso, é ele. Eu chorava, e ele se mantinha forte, mas o medo era grande. Quando o período crítico passou, percebi que ele também precisava de suporte. Já declarou que tinha tendência a ser uma mãe superprotetora. como trabalhou a independência do seu filho, João? É preciso respirar fundo e confiar. Teve a ver com ele ganhar o mundo aos 17 anos, quando foi estudar nos Estados Unidos. Hoje, faz faculdade de Economia em Miami. Mas é um trabalho eterno de entender que ele já cresceu. João é filho único, e vamos querer cuidar dele para sempre. Top Intimissimi, camisa Rober Dognani, luvas Minha Avó Tinha, pulseira Swarovski, calça Aläia na NK Store, cinto Virgínia Cavalheiro, meia-calça Calzedonia e sapatos Schutz Gustavo Ipolito Como vê os influenciadores na moda? Há lugar para todos, mas tudo depende do objetivo do estilista. Se ele quer colocar 10 influencers na passarela, ok, mas perde a essência, porque o foco se torna a pessoa e não a peça. Entendo que o número de seguidores é importante, um caminho sem volta. Mas é preciso ter personalidade, saber se comunicar, estar forte na moda, ter o que dizer, para depois se tornar um influenciador. No último ano, houve um troca-troca dos diretores criativos nas marcas de luxo. Como analisa esse movimento? Todo mundo está perdido. Quando uma marca abraça uma causa, é preciso ir até o fim, porque se parar no meio, “quebra”. Não dá para levantar a bandeira da diversidade, por exemplo, se não puder sustentá-la. O mercado também surfou na onda dos rappers, da rua, dos sneakers... As marcas tentaram ser modernizar, mas qual é o DNA delas? Como surgiram? Não dá para se afastar muito disso. Economicamente também há uma crise mundial no luxo. Vê saída para esse problema? O luxo ainda está tentando se entender, vivemos um processo de mudança. Os valores praticados hoje não cabem na realidade. Quiseram propagar a ideia de que a moda é democrática, mas é uma mentira, não faz parte da realidade de todos. E não precisamos de um item de marca para sermos importantes. No caso do Brasil, o futuro da moda, a longo prazo, é conseguir unir forças com conhecimento estético, ancestral, um olhar refinado no fazer, para que isso se torne o nosso luxo.