Projeto de surfe para mulheres maduras muda vidas e expande horizontes

A frase “não há nada que um bom dia de surfe não cure” pode ser batida. Mas, para algumas mulheres em especial, ela se materializa. O projeto Na Onda Delas, fundado em Búzios pela argentina Maria Belén Olivero Orbea, exemplifica esse poder ao impactar a vida de surfistas 40 +. “Somos as sereias de Geribá”, brinca Maria Belén. Tudo começou em 2018, quando a argentina “resolveu se aventurar no mar”, estimulada pelos três filhos. “Sou de Mar del Plata, formada em Belas Artes e moro em Búzios há 30 anos. Quando cheguei, a cidade era uma aldeia de pescadores”, recorda-se. O desejo de viver a vida sobre as ondas surgiu na rotina materna, no ir e vir de aulas de surfe. Ela tinha 43 anos quando ganhou de aniversário a primeira prancha. “Porém, ao ingressar no mar, esbarrei no etarismo e no machismo, não existiam outras da minha idade praticando o esporte”, lembra. Decidida a ter mais mulheres ao redor, convocou e contagiou as amigas, que, por sua vez, convidaram outras amigas. “No primeiro encontro, éramos 12 integrantes. Em três meses, passamos a ser 40”, contabiliza. A persistência de Maria Belén fez do surfe um canal transformador para quem, como ela, deseja desfrutar dos benefícios do esporte nessa faixa etária. “Criamos uma rede de mulheres maduras que descobre essa atividade física também como forma de superação”, explica. De exercício e lazer, o surfe virou missão na sua vida. Para participar das aulas, basta pagar uma taxa de R$ 15. “Acontecem às quartas-feiras e aos domingos, no canto esquerdo de Geribá. Atendemos, atualmente, mais de 80 mulheres. Nossa metodologia segue as melhores práticas realizadas em escolas e institutos de surfe do Brasil”, garante. Homem, diz ela, só os instrutores. “Quero agora expandir para Cabo Frio.” O movimento de Belén mudou a vida da segurança Maria Luísa da Silva Carvalho, de 56 anos. Da Baixada Fluminense, ela jamais sonhou estar sobre uma prancha. “Nunca imaginei que pudesse surfar”, diz Maria Luísa, que mora em Búzios há quatro anos. Quando se deparou com os efeitos da menopausa, encontrou no surfe uma tábua de salvação, literalmente. “Era sedentária e vi meu corpo mudar”, frisa. “Comecei a engordar por conta do climatério e os fogachos também passaram a me incomodar bastante. Quando descobri o projeto, logo fui muito bem recebida. A partir dali, uma porta se abriu”, declara. Maria Luísa foi além. “O surfe também salvou o meu casamento. Quando meu marido se aposentou, fiz com que ele também começasse a surfar. Fizemos uma renovação de alianças devido ao esporte”, explica a segurança. O fotógrafo Fe Pinheiro, que assina as fotos deste ensaio, é fã do projeto. “Em 2021, me mudei para Búzios para ficar perto da minha mãe. Depois de morar 23 anos na Europa, voltei para minha terra e para o surfe”, narra. “Naquele momento, conheci um grupo de mulheres incríveis. De todas as idades e com histórias diferentes, elas escolheram recomeçar. O mar nos aproximou, mas o que nos inspirou foi a troca diária e a vontade de praticar uma atividade que encara a natureza. O projeto desafia estereótipos”, emenda. A aposentada Maristani Guedes, de 66 anos, é exemplo de superação. Em 2020, depois de enfrentar um câncer de mama e a perda do marido, com quem estava casada há 40 anos, pediu “uma resposta a Deus”. “Sou cristã e comecei a orar muito. Tive a resposta ao ver a Maria Belén na TV falando que o projeto era direcionado para mulheres maduras”, recorda-se. “Lembro-me de ter gritado: ‘É para mim!”, exclama. Hoje, a ex-bancária, que mora em Cabo Frio, frequenta religiosamente as aulas em Geribá e surfa também nos outros dias da semana. “Abriu um leque. Comecei a nadar e a fazer musculação. Viajo para outros estados para surfar, sou a tia mais abusada do Na Onda Delas”, afirma, animada. “O surfe anda de mãos dadas com a autoestima”, conclui Belén.