Defensoria aciona Justiça após denúncia de estupros contra sete menores em abrigo na BA

A Defensoria Pública do Estado da Bahia (DPE-BA) ajuizou uma ação civil pública contra o município de Vitória da Conquista, na última sexta-feira, por conta das denúncias de estupros de vulneráveis envolvendo ao menos sete crianças e adolescentes em abrigos da cidade. A alegação é que os menores, que deveriam receber proteção, foram submetidos a um ciclo de violência "dentro das próprias instituições que deveriam acolhê-las". Na Bahia: 'Ponto cego' trava rastreio de suspeitos de matar mãe, filha e amiga em praia turística Leia também: 'Vi que era possível e fui atrás', diz jovem que ganhou bolsa de R$ 2,2 milhões para estudar fora A denúncia foi feita pelos próprios Conselhos Tutelares do município. De acordo com a Defensoria, os documentos apresentados pelos conselheiros registram "suspeitas graves de abusos e negligência" nos abrigos "Acolhendo e Cuidando” e “Casa de Acolhimento”. Um boletim de ocorrência já foi registrado. Conforme os relatos, seis crianças — com idades de 3 a 10 anos — do abrigo "Acolhendo e Cuidando" denunciaram os abusos sexuais durante uma audiência na Vara da Infância e Juventude, no mês de julho, cometidos por um adolescente de 13 anos de idade que também estava acolhido na unidade. O suspeito, então, foi transferido para a “Casa de Acolhimento”, mas fugiu no mesmo dia. Defensor público estadual, Luciano Rocha informou ao GLOBO que o órgão foi acionado no dia 11 de agosto, e os documentados apresentados mostraram "um cenário de colapso total no sistema de proteção". O profissional também lembrou o fato de Vitória da Conquista ser o terceiro maior município da Bahia, o que "dimensiona a gravidade e a urgência do caso". — Os abrigos municipais, que deveriam ser locais de segurança, se tornaram palco de um verdadeiro filme de terror, com denúncias gravíssimas de estupros — afirmou Rocha, que também apontou denúncias de "fugas sistemáticas, maus-tratos, uso de substâncias proibidas e a convivência de crianças de diferentes idades e sexos sem qualquer supervisão adequada" nesses locais. Os psicólogos que atenderam as vítimas apontaram marcas no corpo, distanciamento social, perda de apetite e comportamento agressivo por parte das crianças. Os menores também detalharam os abusos sexuais sofridos, que se enquadram como estupro de vulnerável, e relataram sofrer ameaças do agressor. Além do boletim de ocorrência, os menores realizaram exames de corpo de delito. Uma das vítimas é uma criança de apenas 3 anos. Outro alvo é uma criança de 9 anos, acolhida há menos de dois meses das denúncias, justamente por vivenciar suposta situação de abuso sexual em casa. Segundo a Defensoria, a Justiça determinou a realização de auditoria técnica independente nos abrigos em um prazo de até 15 dias, bem como uma avaliação médica e psicológica dos menores acolhidos em até cinco dias. A decisão judicial estabelece um prazo de 20 dias para a apresentação de um "plano de adequação", sob pena de multa diária de R$ 5.000,00 em caso de descumprimento. A decisão também define "o reforço cautelar da supervisão nas unidades em até 10 dias, havendo a separação física rigorosa entre crianças de diferentes faixas etárias, com reforço da segurança e supervisão". Segundo Luciano Rocha, pelo fato do processo tramitar em segredo de justiça — conforme determina o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) —, a Defensoria não pode detalhar a localização e a situação específica de cada menor após as denúncias. O objetivo é "garantir a proteção integral das vítimas". — O que posso afirmar é que elas estão sob a proteção desta decisão judicial, e a nossa prioridade máxima é garantir que recebam, imediatamente, todo o suporte psicossocial e a segurança que lhes foram negados — ressaltou o profissional. 'Total violação' Na última quarta-feira, a vereadora Márcia Viviane (PT) abordou o assunto durante sessão da Câmara Municipal. De acordo com a parlamentar, há registros de ameaças com arma branca, agressões físicas, consumo de drogas, negligência e fugas em massa nas unidades de acolhimento em questão. "Essa omissão fere a Constituição e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)", disse a vereadora. "Vamos cobrar em todas as instâncias a interdição dos abrigos e a realocação das crianças. Saber que nenhuma medida foi tomada pela prefeitura me deixa chocada. É um caso de total violação dos direitos humanos”, completou. A Defensoria afirmou que, além das denúncias de violência sexual, também foram relatadas "evasões recorrentes de adolescentes entre 2024 e 2025, totalizando 12 casos, com destaque para casos de reincidência". Ainda conforme o órgão, a ação judicial passou a ser a única opção, já que a prefeitura se omitiu "mesmo após sucessivos alertas". De acordo com os registros, os Conselhos Tutelares alegam que não foram respondidos pelas instituições em questão ao solicitarem o acompanhamento das medidas de acolhimento e do plano pedagógico. Procurada pelo GLOBO, a prefeitura de Vitória da Conquista não respondeu até a publicação desta reportagem.