Diante da queda percentual de chamadas atendidas pela central do 190 e a avaliação de uma “deterioração progressiva” no serviço, identificadas no ano passado, a Polícia Militar do Rio analisa a contratação de uma empresa de call center para atender o telefone de emergência da corporação. Com isso, agentes que trabalham no serviço atualmente poderiam ser empregados em outras atividades, como o policiamento ostensivo. A contratação deverá ocorrer por meio de licitação, via pregão eletrônico, com o menor preço como critério de julgamento, conforme prevê um estudo técnico preliminar, elaborado em maio deste ano pela Diretoria Geral de Tecnologia da Informação e Comunicação, ao qual O GLOBO teve acesso. Tentativa de assalto: suspeitos de tentar roubar PM são presos ao dar entrada no Hospital Carlos Chagas com comparsa baleado Segurança pública: PM do Rio pede acesso às câmeras dos ônibus para coibir crimes Ao todo, 188 atendentes terceirizados se dividiriam em turnos de 6 horas diárias, com 40 funcionários simultâneos atuando no Centro Integrado de Comando e Controle (CICC), na Cidade Nova, na capital fluminense, onde está instalada a central do 190. O serviço continuará operando 24 horas, nos sete dias da semana, mas com policiais militares apenas como monitores, como acontece em São Paulo, por exemplo. No estado vizinho, são recebidas 50 mil ligações diárias, em média, com atendentes terceirizados registrando os chamados e direcionando para outros setores, informa a Secretaria de Segurança Pública paulista. A supervisão e tomada de decisões, por outro lado, seguem a cargo de policiais. Central 190 pode ser terceirizada na PM do Rio Brenno Carvalho / 31-03-2023 Professora do curso de Segurança Pública da Universidade Federal Fluminense, Jacqueline Muniz pontua que centrais de atendimento já são operadas por civis nos Estados Unidos e na Europa, por exemplo. Como vantagens enumeradas por ela estão a formação plural e salários 30% menores para ter um atendente qualificado, que passaria por treinamentos de três a seis meses e atuam com protocolos claros. —É melhor gastar a polícia, que é caro, fazendo o policiamento. Mesmo que despacho tenha supervisão policial, isso não é problema nenhum: provavelmente é como vai funcionar aqui e já é assim no Ceará e em São Paulo, são os modelos híbridos — menciona ela, colocando como desafios a reestruturação da estrutura da PM e os trotes (hoje, 6% das ligações). — Não há necessidade de ter porte de arma nem carteira de policial para fazer o atendimento: isso significa economizar na atividade meio, racionalizar a prestação de serviços, reduzindo o tempo de resposta. De acordo com a especialista, as principais demandas da população não são sobre o crime organizado, mas sobre desordens, como som alto, e brigas. Atualmente, perturbação da ordem e violência doméstica são os principais motivos de ligações para o 190 fluminense. Justificativas Fernando Gutman Barbosa, gerente de projetos da PM, assina o estudo de 68 páginas, demandando pelo coronel Gilbert dos Santos, do Centro de Controle Operacional da Polícia Militar (Cecopom). Segundo o texto, foi identificada queda no percentual de chamadas atendidas pelos atendentes do serviço de atendimento de emergência da corporação no ano passado: outubro teve o menor percentual de atendimentos desde o início do monitoramento (que iniciado no ano retrasado): 82,42% das chamadas foram atendidas (o ideal deve estar acima dos 93%), com projeção de piora, “reforçando a urgência de medidas corretivas”. A queda progressiva de atendentes também é citada. Em 2024, a média diária era de 31 atendentes (número considerado o mínimo aceitável para garantir o atendimento), enquanto o número diário chegou a 22 em novembro. Questões de saúde e faltas, as movimentações para outras unidades da polícia estão entre os motivos para essa queda, além do envelhecimento e entrada da reserva de policiais que são substituídos por atendentes do 190 em outros setores. Ao menos 47 praças deixaram o atendimento de emergência desde 2023. Em outubro, 146 policiais, entre subtententes, sargentos, cabos e soldados, estavam lotados no setor. Outro agravante é que setores do interior do Rio — Volta Redonda (5º CPA), Campos (6º CPA) e Teresópolis (7º CPA) —, que tinham ligações encaminhadas para batalhões de área, passaram a direcionar as ligações para a central 190, o que colaborou para o aumento em 24% na média mensal de chamadas recebidas na central 190: o salto foi de 136 mil, em 2023, para 167 mil no último ano, com outubro tendo registrado o pico de atendimentos (200 mil). Desde dezembro do ano passado, o processo para a possível contratação da central de teleatendimento foi aberto e, em junho, suas últimas movimentações foram com a aprovação do estudo e encaminhamento para "fases subsequentes do processo licitatório", conforme reconheceu a Diretoria Geral de Tecnologia da Informação e Comunicação da PM. Em nota, a PM informa pontua que “até o momento, não há qualquer definição a respeito de mudanças no Serviço de Emergência 190”. Custo Em média, a estimativa é que esse serviço tenha custo mensal de cerca de R$ 1,8 milhões ao Estado (R$ 21,8 milhões ao ano), valor 44% maior que o gasto em folha atualmente com os profissionais que trabalham no 190: R$ 1,2 milhão (entre salários e valores de pagamento de hora extra, com o Regime Adicional de Serviço). No entanto, o estudo da PM pontua que “o valor da contratação deverá ter uma redução” após a licitação. A redução com custos de salários e encargos previdenciários são apontados como vantagens, assim como a reposição imediata de mão de obra em casos de baixa, o que não é possível hoje. O antropólogo Robson Rodrigues, ex-chefe do Estado-Maior da PM, lembra que o estado viveu na década passada a experiência de contratar terceirizados para atender no 190, mas que "houve um descuido" e que "havia uma insensibilidade" por parte dos atendentes. O serviço voltou para as mãos de policiais ao fim de um órgão da Secretaria de Segurança. Por isso, para ele, o contrato com os novos atendentes deve deixar claro que a população deve estar "em primeiro lugar". —Deve-se visar sempre o bom atendimento e o amparo, não só uma um atendimento eficiente, mas também esse aspecto emocional das pessoas. Os profissionais têm que ter uma habilidade muito grande. É um serviço de emergência — pontua. Em Sergipe, onde o serviço tem terceirizados desde 2009, 88 atendentes se revezam em quatro turnos para atender as ligações. Eles são os responsáveis por colher informações da ocorrência e encaminhá-las aos batalhões, onde policiais as recebem e encaminham para a rua, enviando alertas para policiais na rua, por exemplo. — Como são funcionários de CLT, caso algum esteja com desvio de conduta, é mais fácil de você corrigir, demitir, por exemplo, e contratar alguém que tem o perfil e se enquadre naquilo que a gente entende como um atendimento padrão — pontua o tenente coronel J. Luiz Ferreira, diretor do Centro Integrado de Sergipe, que atende as ligações do 190 do estado. No Rio, Os atendentes — que devem ser ágeis na digitação, ter mais de 18 anos e Ensino Médio Completo — passarão ainda por uma avaliação psicológica para esse tipo de serviço. A ausência de antecedentes criminais, assim como a “avaliação de conduta social, reputação e idoneidade” do candidato, também serão levados em consideração na contratação. O salário deve ser em torno de R$ 2 mil.