Chrome à venda? Tribunal dos EUA pode forçar Google a se desmembrar; entenda

Há um ano, um Tribunal Distrital Federal decidiu que o Google violou as leis antitruste ao usar meios ilegais para manter o monopólio das buscas online. Agora, o tribunal deve definir qual será a punição para a gigante da tecnologia. Leia também: Leitura por prazer despenca nos EUA: estudo aponta queda de 40% em duas décadas Pombos e IA? Experimentos com animais na Segunda Guerra Mundial inspiraram a tecnologia de hoje O cardápio de opções é amplo. A corte poderia ordenar o desmembramento da empresa — forçando a venda do navegador Chrome ou até mesmo do sistema Android? Exigir que o Google compartilhe dados valiosos com rivais? Ou adotar uma combinação dessas medidas? O impacto da decisão vai muito além do Google. O resultado ajudará a definir o futuro da inteligência artificial — especialmente no quanto abrirá espaço para uma nova geração de empresas menores, possivelmente até fora do Vale do Silício, competirem na era da IA. O caso começou com o questionamento dos pagamentos bilionários feitos pelo Google — que somaram mais de US$ 26 bilhões em 2021 — para Apple, Samsung e outras fabricantes, em troca de manter o monopólio das buscas. Mas o que está em jogo não se limita a um mercado já consolidado. O alvo real sempre foi o ecossistema mais amplo de recuperação de informações, prestes a ser transformado por tecnologias como chatbots e sistemas de IA. Mesmo antes do veredito, o processo já mudou o setor. Sob intensa vigilância, o Google vem atuando com cautela. O chatbot Gemini, que rivaliza com o ChatGPT da OpenAI, poderia ter sido imposto ao mercado com os mesmos bilhões usados para consolidar a busca. A empresa provavelmente teria oferecido somas vultosas a gigantes como a Apple — e também pressionado companhias menores — para colocar o Gemini no centro de seus serviços. Com o cerco antitruste, essa prática perdeu força. A repórter especializada Leah Nylen relata que executivos da Apple passaram a pensar diferente na ausência desses pagamentos, optando por integrar o ChatGPT, e não o Gemini, à busca assistida por IA do iPhone. Startups como a Perplexity também dizem sentir maior liberdade para competir. No mínimo, a decisão judicial formalizará essa nova realidade, impondo limites claros à capacidade do Google de usar seu caixa para sufocar rivais. Mas a corte pode ir além — e, quanto mais profunda for a punição, maior o potencial de abalar o setor e abrir espaço para concorrentes menores e mais inovadores. Uma das hipóteses é que o tribunal obrigue o Google a vender o Chrome — navegador dominante no mundo, com 67% do mercado global. A Perplexity, inclusive, já apresentou uma oferta de US$ 34,5 bilhões. Como o Chrome é usado para levar usuários à Busca Google e ao Gemini, além de gerar dados valiosos, sua separação poderia transformar completamente o mercado de buscas e IA. Outra possibilidade é obrigar o Google a licenciar seus dados de cliques e consultas de pesquisa. Esse conjunto de informações — as perguntas feitas e os links escolhidos pelos usuários — funciona como combustível de alto desempenho para treinar sistemas de IA e dar vantagem a concorrentes menores. Seja qual for a medida, o critério para medir sua eficácia será simples: profissionais de grandes empresas como o Google começarão a deixá-las para fundar startups? Foi isso que aconteceu no acordo antitruste de 1956 entre AT&T e o governo americano, que limitou a companhia ao setor de telecomunicações e impulsionou a indústria de semicondutores. Algo semelhante ocorreu com a ação movida contra a Microsoft na década de 1990, que abriu caminho para a internet moderna. O setor de tecnologia vive hoje uma lenta mudança de guardas. A questão central é se plataformas dominantes, como o Google, conseguirão manter seu poder na era da inteligência artificial. Avaliar medidas antitruste de forma restrita seria um erro. Como a derrubada de uma árvore centenária em uma floresta, o essencial não é apenas o que cai, mas o que nasce a partir disso.