Brasil e França lançam expedição científica e cultural pelo rio Amazonas

Um grupo de cientistas brasileiros e franceses apresentou nesta quarta-feira, em Belém, alguns detalhes de como será a caravana fluvial Iaraçu, uma iniciativa conjunta entre os governos dos dois países para fomentar redes de conhecimento na região amazônica. O programa, que abriu edital no início do mês para submissão de projetos, consiste em uma expedição que terá início em 28 de outubro e termina depois da COP30, a conferência do clima da ONU, em 20 de novembro. A ideia da iniciativa é levar conhecimento relacionado a mudanças climáticas e temas socioambientais para habitantes da região e, em contrapartida, mapear como os amazônidas ao longo do maior rio tropical do mundo estão enfrentando a crise do clima e desafios de desenvolvimento. Uma embarcação com 14 cabines de capacidade deverá ter uma população 28 de cientistas e agentes culturais que poderão se alternar durante o trajeto. O barco percorrerá lentamente o caminho de Manaus até Belém, com paradas em diversos pontos para incursões por terra. O projeto envolve inicialmente as universidades federais do Pará e do Amazonas junto do Centro Franco Brasileiro de Biodiversidade Amazônica, que se divide entre Amapá e Guiana Francesa. Os projetos a serem levados a cabo na expedição, porém, podem ser submissões de estudantes e pesquisadores em qualquer universidade do país, desde que estejam dentro da temática da expedição. Segundo o idealizador da proposta, Abdelfettah Sifeddine, diretor interino do CFBBA, a ideia é que instituições de pesquisa levem até comunidades da região o conhecimento científico que seja demandado por elas e, em contrapartida, recolham depoimentos para ajudar a pautar a ciência amazônica. — Isso é importante, porque, precisamos ir além de fazer a ciência pela ciência. Nós precisamos ver se essa ciência que estamos fazendo vai servir de alguma maneira para a sociedade. Então, temos que escutar a sociedade. Os ribeirinhos vão criar indicadores antropológicos para a gente adequar a nossa pesquisa para a solução de problemas que eles conhecem — afirma. O anúncio da proposta foi feito na UFPA durante o seminário Conexões Amazônicas, que governos francês e brasileiro promoveram nesta semana para divulgar pesquisas colaborativas entre os dois países feitas na região, no Museu Paraense Emilio Goeldi, em Belém. A reunião integra a Temporada França-Brasil 2025, série de eventos de comemoração marcando 200 anos de relações diplomáticas entre os dois países. O volume de recursos empenhados para a caravana Iaraçu não foi divulgado ainda, e deve ser definido em detalhes só após o fechamento do edital para projetos de pesquisa. O projeto é bancado no lado francês pelo Instituto de Pesquisa para o Desenvolvimento (IRD) e do lado brasileiro por instituições federais, incluindo as agências de fomento a pesquisa Capes e CNPq. Os pontos de paradas definidos para a expedição são inicialmente as principais cidades e centros estratégicos entre as capitais do Amazonas e do Pará: Manaus, Itacoatiara, Parintins, Óbidos, Alter do Chão, Almeirim, Porto de Moz, Gurupá, Breves e Belém. Ciência de raiz Segundo Sophie Jacquel, representante da embaixada francesa para assuntos culturais, um dos objetivos da caravana Iaraçu é promover uma maneira de fazer ciência que escute mais a comunidade. — Nós queremos promover uma troca, porque muitas vezes a ciência é feita com uma visão de cima para baixo — afirma. — Essa maneira de fazer ciência participativa é importantíssima para a nossa cooperação franco-brasileira na Amazônia. A maneira de fazer ciência "de baixo para cima" implica, de todo modo, que é preciso aceitar objetivos pouco claros logo de início, diz a diplomata, defensora de que a expedição abrace o espírito de aventura. A embarcação que conduzirá a caravana é um barco de desenho tradicional amazônico com espaços de convivência que acomodam mais pessoas nos períodos de ancoragem. Em princípio, o número de propostas de pesquisa aprovados, não vai superar o de passageiros, e a acomodação vai depender da escolha dos projetos e de suas necessidades de equipamentos. O edital encerra a recepção de propostas nesta semana, mas avalia prorrogar até o dia 10 de setembro. O cientista da UFAM envolvido na coordenação da empreitada, o geólogo Naziano Filizola, afirma que uma das inspirações para o Iaraçu foi o projeto "Rios Online", que a universidade criou para interagir de forma mais permanente com populações ribeirinhas e acompanhar suas demandas. — No projeto a gente entra em conexão com os ribeirinhos, eles mandam fotografias das situações dos rios, a gente transforma essas fotografias em posters e leva de volta para a comunidade, para as escolas para mostrar a situação dos rios com mais informações — conta. — Nessas idas às comunidades, a gente estabelece rodas de conversa com os comunitários, eles demonstram suas demandas, seus problemas. Nós desenvolvemos inclusive um aplicativo para que eles possam repassar essas demandas para nós e para o Ministério Público de forma anônima. A ideia da expedição, porém, é promover interações mais abertas. A UFAM afirmam também que pretende montar um pequeno museu itinerante científico com peças como fósseis, minerais de acervos da instituição para serem exibidos ao longo do projeto. Durante a COP30 no início de novembro, o barco deve ficar ancorado em Belém. O repórter viajou a Belém a convite da Temporada França-Brasil 2025