O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, anunciou nesta quarta-feira que mais de 100 mil casas ficaram sem eletricidade em três regiões do país, após um ataque a drone lançado pela Rússia atingir instalações energéticas ucranianas. A ação de Moscou foi apenas o incidente mais recente em uma frente particular da guerra, em que fontes de combustível e meios de produção de energia se tornaram alvos preferenciais nos dois lados da fronteira — em uma tentativa mútua de enfraquecer a posição inimiga durante as negociações para encerrar o conflito. Central nuclear de Kursk: Incêndio atinge usina nuclear russa após drone ucraniano ser abatido Sem cometer deserção: Ucrânia suaviza lei marcial, e homens com idade entre 18 e 22 anos poderão sair do país O momento atual do conflito é um dos períodos de maior intensidade de ataques a alvos energéticos. O Exército ucraniano reivindicou ao menos 10 ataques contra o setor de petróleo russo no último mês, metade dos quais foram admitidos pelas autoridades rivais. Em contrapartida, o ministro do Interior da Ucrânia, Ihor Klymenko, reconheceu que 20 instalações, incluindo subestações elétricas, refinarias de petróleo e usinas termoelétricas, foram danificadas nas últimas semanas. Initial plugin text O crescente número de ataques neste perfil acontece após meses de uma relativa calmaria para o setor. Em março, tanto Moscou quanto Kiev concordaram em suspender os ataques contra alvos de infraestrutura energética, dentro de uma das primeiras tentativas do presidente americano, Donald Trump, de intermediar um cessar-fogo. Porém, em meados de junho, a Rússia bombardeou uma usina de petróleo e instalações de gás ucranianas, o que motivou, segundo Kiev, uma resposta nos mesmos termos. Drones ucranianos de longo alcance atacaram refinarias de petróleo no sudoeste e centro da Rússia, provocando incêndios de grande escala e interrompendo operações em diversas instalações. Entre os alvos estava a gigante refinaria da Lukoil em Volgogrado — a maior do sul da Rússia e uma das 10 maiores do país, segundo autoridades ucranianas e russas. A agência de notícias Reuters calculou que os ataques recentes prejudicaram 17% da capacidade de refino da Rússia. Conheça o Renwar: Projeto de pesquisa desenvolvido na Noruega promete revolucionar investigações de crimes de guerra Objetivo além do front Os ataques trocados contra as infraestruturas energéticas buscaram atingir diferentes objetivos ao longo da guerra. Moscou frequentemente bombardeou instalações ucranianas na tentativa de cortar a eletricidade que alimenta a economia do país, além de provocar apagões em zonas residenciais e quebrar a moral da população civil. Por sua vez, autoridades ucranianas listaram três objetivos: interromper o abastecimento de aviões e tanques; reduzir os lucros de Moscou com exportações; e perturbar a vida cotidiana dos russos comuns. Especialistas apontam que a nova onda de ataques tem como particularidade o avançar das tentativas diplomáticas lideradas pelos EUA. Zelensky confirmou que uma delegação ucraniana se reunirá com a equipe de Trump em Nova York na sexta-feira, enquanto o Kremlin sinalizou que negociadores dos dois países permanecem em contato — embora tenham acenado negativamente para uma reunião de cúpula no curto prazo. — Para a Ucrânia, é importante pressionar a Rússia durante essas negociações de paz — disse Andrian Prokip, especialista em energia do Instituto Kennan, em Washington, em entrevista ao New York Times. — Esses ataques são uma ferramenta importante de pressão. O líder ucraniano, Volodymyr Zelensky, reúne-se com o presidente Donald Trump na Casa Branca ANDREW CABALLERO-REYNOLDS / AFP Impactos imediatos Apesar dos ataques não terem sido suficientes para dobrar o inimigo até o momento, repercussões já podem ser notadas na prática dos dois lados. Na Ucrânia, o presidente da subcomissão de política de gás natural, Andrii Zhupanyn, estimou que os ataques russos custaram cerca de 1 bilhão de metros cúbicos de gás natural — cerca de 5% das necessidades anuais do país —, o que forçou o governo a buscar com urgência financiamento com parceiros europeus para comprar e importar gás antes do inverno. Em contrapartida, na Rússia, o principal dano vem sendo registrado no dia a dia de cidadãos comuns. O preço dos combustíveis subiu abruptamente — 12% em um mês, até meados de agosto — à medida que os ataques ucranianos minaram a capacidade de produção e refino. Em determinadas regiões, a escassez deixou postos de combustível totalmente desabastecidos, e motoristas frustrados. O impacto econômico mais amplo, porém, não foi arrasador por uma série de características de mercado e do próprio conflito, na análise de Sergey Vakulenko, ex-alto executivo da Gazprom Neft e especialista em energia da Carnegie Endowment for International Peace. A dinâmica no campo de batalha, onde os avanços russos costumam ser feitos por tropas a pé ou em motocicletas, reduz o impacto de uma eventual escassez de combustível de uso militar. No âmbito econômico, a receita russa com exportações de petróleo são em sua maioria de petróleo bruto, não de produtos refinados, de acordo com o especialista. Kiev vem tentando ampliar o escopo de seus ataques para maximizar os danos. Um novo objetivo tem sido cortar o fornecimento de combustível russo para a Europa Central. Na semana passada, a Ucrânia atacou o oleoduto Druzhba, que abastece Hungria e a Eslováquia com petróleo bruto — cujos líderes atuais mantêm laços com o Kremlin e adotam posturas hostis em relação à Ucrânia. — Os ataques são uma boa ferramenta para mostrar que, como Trump diz, temos algumas cartas na manga — disse Zhupanyn.