JORGE ABREU SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O MPF (Ministério Público Federal) apontou, nesta quarta-feira (27), como ilegal o monitoramento do Governo do Pará sobre indígenas por meio do PPDDH (Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos), e acionou a Justiça Federal. Como revelado em reportagem do portal Jota, a gestão de Helder Barbalho (MDB) espionou lideranças indígenas durante os protestos em Belém, iniciados em janeiro, contra educação online nas aldeias. Os atos se encerraram, após um mês, quando o governo estadual revogou a lei aprovada em dezembro de 2024, que mudava diretrizes da educação pública. Desde então, o MPF, a DPU (Defensoria Pública da União) e a Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) movem um processo contra o Governo do Pará e o governador por divulgação de informações falsas sobre a mobilização dos povos tradicionais. A manifestação da Procuradoria sobre ilegalidade no monitoramento de indígenas foi incluída nessa ação. Em fevereiro, uma decisão judicial determinou a remoção das publicações com conteúdo considerado falso e a veiculação de um vídeo com o direito de resposta de grupos indígenas e quilombolas, sob pena de multa. As medidas não foram tomadas. Agora, o MPF acusa Helder Barbalho de "desobedecer deliberadamente" a decisão. O MPF pediu nesta quarta-feira à Justiça Federal o bloqueio das redes sociais do governador até a publicação de direito de resposta, multa institucional para o governo de R$ 10 milhões, multa pessoal para Helder também de R$ 10 milhões (com bloqueio de valores) e o reconhecimento de ato atentatório à dignidade do Poder Judiciário. Procurado, o Governo do Pará não comentou o caso. A gestão afirma não ter sido notificada ainda pelo MPF. Para o MPF, Helder Barbalho está "há mais de 90 dias descumprindo decisão judicial unicamente por considerar o suposto dano à sua imagem política ao veicular o direito de resposta das comunidades indígenas em suas redes sociais na véspera da COP30 [conferência do clima que será realizada em Belém em novembro]". A Procuradoria solicita, por essa razão, uma outra multa de R$ 2 milhões. Questionado sobre o uso do PPDDH para monitoramento, o governo estadual também não comentou as práticas. Segundo a ação do MPF, o monitoramento ilegal foi admitido em depoimento judicial por Carlos André Viana da Costa, secretário adjunto de inteligência e análise criminal da Segup (Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social). Ele seria o responsável por uma operação de vigilância de lideranças que estão sob proteção do Estado, incluídas no PPDDH. O governo teria colaboradores infiltrados na mobilização dos manifestantes, conforme o depoimento do secretário. Eles repassariam informações em tempo real sobre as ações. "E nesse dia a gente fez o acompanhamento desde a movimentação nas localidades indígenas, né, quando a gente percebeu pelos nossos colaboradores (…) vai sair um ônibus, possivelmente vai lá para Belém, para a Seduc", dosse Costa, em trecho do depoimento transcrito na peça do MPF. Para o MPF, o monitoramento "é claramente ilegal e absolutamente preocupante" e viola a privacidade e a liberdade de associação, subvertendo o propósito dos programas de proteção. O órgão pediu à Justiça que os relatórios de inteligência da Segup sejam removidos do processo judicial por serem "construídos de maneira evidentemente ilegal". Alane Luzia da Silva, advogada da ONG Terra de Direitos, afirma que o uso indevido do PPDDH põe em risco a credibilidade da política de proteção de ativistas em vulnerabilidade, que dependem do Estado para permanecerem vivos. "Agora tem esse questionamento se podem ou não podem confiar nessa estrutura do programa, pois se forem incluídas no programa, eles vão compartilhar informações sensíveis de localização, de estratégia de segurança, de dados pessoais", comentou. "A sociedade civil como um todo lutou e tem lutado há muitos anos pelo fortalecimento desse programa. A gente aguarda ainda que o governo federal publique e implemente o Plano Nacional de Proteção e tinha a esperança de fortalecer institucionalmente esse programa. Agora vem essa notícia que enfraquece muito a política de proteção", avaliou a advogada.