Comunidades do Horto: após assinatura de acordo com Jardim Botânico, desafio é impedir expansão das construções na área

Depois de uma batalha de mais de 40 anos, um acordo assinado ontem pôs fim a um longo conflito judicial e garante a permanência de centenas de famílias nas comunidades do Horto, que resistiram a várias ações de reintegração de posse movidas pelo Instituto de Pesquisas Jardim Botânico, proprietário da área, e pelo Ministério Público Federal (MPF), conforme informou o blog do jornalista Ancelmo Gois, do GLOBO. Um dos pontos centrais do acerto é um desafio: a proibição de expandir os imóveis tanto na vertical quanto para os lados, assim como novas construções. Metanol: Estado do Rio tem cinco casos suspeitos de intoxicação em investigação Perturbação do sossego: Leblon e Botafogo estão entre os lugares mais barulhentos do Rio As terras do Jardim Botânico foram cedidas, no passado, para a moradia de antigos funcionários. Com o correr do tempo, os imóveis do Horto passaram de pais para filhos, e muitos deles acabaram alugados e até mesmo vendidos. Outros foram construídos nos terrenos do governo federal. Hoje, oficialmente o instituto contabiliza 621 moradias. — Nossa política habitacional é frágil. Na Vila Benjamin Constant (Praia Vermelha), aconteceu algo semelhante ao que ocorreu no Horto. O Instituto Benjamin Constant cedeu terrenos para que seus funcionários construíssem moradias, mas a vila explodiu de tamanho. É difícil controlar o crescimento das comunidades. Ao mesmo tempo em que é preciso preservar o meio ambiente, há um direito constitucional à moradia. Será um desafio impedir o crescimento das comunidades que estão em terras do Jardim Botânico. A prefeitura deveria exercer essa vigilância — diz o professor Pedro da Luz, do Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal Fluminense (UFF). Diretora da Associação de Moradores e Amigos do Jardim Botânico (AMA-JB), Vera Maurity acredita que os moradores do Horto não permitirão que haja desrespeito ao compromisso assumido: — Não vão querer, por um deslize, correr o risco de perder o que conquistaram. Vão vigiar. Como a área está ocupada Editoria de Arte O acordo foi assinado entre o Jardim Botânico, a Associação de Moradores do Horto (Amahor), a União — por meio da Secretaria-Geral da Presidência da República —, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), o MPF e a Defensoria Pública da União. Da solenidade, participaram ainda representantes do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e da prefeitura. A permanência de 54 casas, que estão sobretudo às margens do Rio dos Macacos ou em área de aclive, vai depender de estudo a ser feito pelo município. As que estiverem em áreas de risco serão realocadas para outros pontos dentro do próprio Horto. Já o trecho ocupado pelo Condomínio Canto e Mello, de imóveis de classe média alta, não está contemplado no acordo, porque, segundo o Jardim Botânico, está sendo realizada nova conferência dos limites do parque. “Caso seja confirmado que o condomínio está dentro do nosso território, serão tomadas ações posteriores”, diz o instituto. Pré-requisitos O ministro da Secretaria-Geral da União, Márcio Macedo, destacou que o acordo é resultado de quase dois anos e meio de diálogo, tendo sido costurado a várias mãos: — Ele tem alcance ambiental, patrimonial e de justiça social. Presidente do Jardim Botânico, Sergio Besserman ressaltou que o acordo é a garantia do fim do conflito e de impedir o crescimento da comunidade: — Além do legado concreto, estamos deixando legado de como se constrói a democracia, com muita escuta. Insetos: proliferação de mosquitos causa transtornos e expõe moradores a doenças em áreas nobres do Rio Pelo acerto, o Jardim Botânico se compromete a apresentar, no prazo de 30 dias, um plano de trabalho para a celebração dos acordos individuais, que garanta aos moradores a outorga das áreas onde estão as unidades habitacionais em até um ano. Durante esse processo, ficam suspensas todas as ações de reintegração de posse nas quais são réus os moradores das comunidades. Para se habilitar à permanência no local e ao direito de posse, os moradores precisarão comprovar ao menos um dos seguintes requisitos: ter recebido autorização formal para edificar em área da União; ter recebido autorização para edificar em área da União comprovado mediante apresentação de registro administrativos ou testemunhos, a ser avaliado por comissão de acompanhamento; ou estar num cadastro realizado em 2011 pela UFRJ. Não serão reconhecidas ampliações da área ocupada após a edição da Portaria número 111, de 2018 (estabelece o controle das entradas, limita a cinco os acessos dos moradores e proíbe a entrada de materiais de construção no parque). O município do Rio se compromete a fornecer os serviços públicos de sua competência. Tempo indeterminado Pelo pacto, ficou acertado ainda que cada morador deverá firmar um termo de acordo individual, no qual o Jardim Botânico concederá direito à permanência no imóvel. Esse termo vale por tempo indeterminado, com a titularidade podendo ser transmitida a herdeiros, em caso de morte. Porém, não é permitido transferir para terceiros, vender ou doar a casa. O uso para fins comerciais também não será permitido, exceto quando se tratar de prestação de serviços e não houver descaracterização do imóvel. Presidente da Amahor, Fabio Dutra disse que o acordo tem uma importância muito grande para os moradores e que, agora, pretende estreitar a relação com o Jardim Botânico. — Para nós, é emblemático esse acordo, porque a gente deixou de ter uma espada apontada para o nosso pescoço. É muito raro uma casa no Horto não ter um idoso e essas pessoas poderem dormir sem o fantasma da reintegração de posse é indescritível — afirmou, acrescentando que que o acordo é resultado de regras que contemplam todos os lados envolvidos na negociação, incluindo a que contém a crescimento da comunidade. BYD no Rio: projeto de R$ 30 milhões prevê até construção de pista para avaliar veículos O acordo que colocou um ponto final nos conflitos que duravam 40 anos —desde quando começaram a surgir as primeiras ações de reintegração de posse—, leva a assinatura de uma representante mais antigas da comunidade. Leni Ribeiro Macedo Soares, de 88 anos, contou que nasceu no local. Seu avô foi o primeiro a chegar, vindo da Espanha. — Esse acordo significa tanta coisa: minha infância, minha família. Meu pai, minha mãe, sete irmãos se foram. Sobramos só eu e uma irmã. Trabalhei aqui nesse prédio (do Jardim Botânico). Brinquei muito aqui, tomei muito banho de rio — recordou.