O já frágil cessar-fogo firmado entre Israel e o Hamas começou a ruir antes mesmo de consolidar a paz na Faixa de Gaza. Nesta semana, forças entraram em confronto com grupos armados rivais, incluindo o poderoso clã Doghmush, em diferentes regiões do enclave. Segundo o Ministério do Interior de Gaza, os embates deixaram ao menos 27 mortos, entre eles oito membros do Hamas, e reacenderam a disputa interna pelo controle do território. Quais são os grupos extremistas em choque com o Hamas em Gaza? Entenda: Em Gaza, 50 milhões de toneladas de escombros e falta de equipamentos desafiam busca por corpos de reféns israelenses O episódio marcou mais um capítulo da antiga rivalidade entre o Hamas e o clã Doghmush — uma das famílias mais influentes e fortemente armadas de Gaza, conhecida por sua autonomia política, poder militar e alianças variáveis. Apesar de alguns de seus integrantes já terem colaborado com o próprio Hamas em determinados momentos, o grupo mantém uma postura independente e frequentemente entra em choque com a liderança islamista. Rivalidade antiga e poder paralelo O clã Doghmush reúne centenas de membros e mantém presença ativa em diferentes cidades da Faixa de Gaza. Ao longo dos anos, seus integrantes se distribuíram por diversas facções, incluindo o Hamas e o Fatah, grupo que domina a Cisjordânia. A família controla rotas de contrabando, depósitos de armas e redes locais de segurança, o que a torna um ator relevante no equilíbrio de forças do enclave. A relação conflituosa com o Hamas remonta a quase duas décadas. Em 2006, o líder Mumtaz Doghmush criou o “Exército do Islã”, uma milícia que chegou a declarar lealdade ao Estado Islâmico e ganhou notoriedade por participar, ao lado do Hamas, do sequestro do soldado israelense Gilad Shalit, posteriormente libertado em uma troca de prisioneiros. Desde então, a família tornou-se símbolo de resistência armada fora do controle do Hamas, desafiando sua autoridade política e militar. Com o recuo parcial das tropas israelenses e a retomada de áreas antes ocupadas, o Hamas mobilizou cerca de 7 mil combatentes para tentar restaurar o controle sobre Gaza. O grupo teme que o vácuo de poder favoreça clãs como o Doghmush, que teriam roubado armas e munições de depósitos do Hamas durante a guerra, e até recebido suprimentos de Israel, segundo fontes locais. As execuções públicas conduzidas pelo Hamas nos últimos dias, registradas em vídeo e divulgadas nas redes sociais, teriam como alvo supostos colaboradores dessas milícias rivais, que o grupo islamista acusa de “traição”. Apesar da ofensiva, o Doghmush segue atuando como uma força paralela, especialmente no sul de Gaza, e simboliza o principal obstáculo interno à hegemonia do Hamas. O líder Mumtaz Doghmush, figura central da milícia, não é visto em público há anos. Seu paradeiro é desconhecido, mas sua influência continua a ser citada por autoridades de segurança e analistas regionais como um fator de desestabilização no território.