Consumidor mostra confiança e segurança na compra do gás de cozinha com as regras atuais, aponta pesquisa

A cada segundo, 13 botijões de Gás Liquefeito de Petróleo (GLP), o popular gás de cozinha, são entregues em algum ponto do país. O insumo, essencial para milhões de famílias, chega em segurança a 100% dos municípios e 91% dos lares brasileiros graças a uma série de normas que regulam a distribuição. Uma das exigências é que cada distribuidora comercialize apenas botijões de sua própria marca, gravada em alto-relevo, o que permite a identificação da empresa responsável pelo produto, além de monitoramento e fiscalização. Os botijões só podem ser vendidos cheios e lacrados, e o enchimento é feito em plantas industriais, com rigor técnico, segurança e ganhos de escala. Regras como essas fazem da regulação brasileira do GLP uma referência internacional, com incentivos à manutenção, requalificação e assistência técnica dos botijões. A cadeia do GLP emprega 330 mil pessoas, que trabalham para levar gás de cozinha a 66 milhões de domicílios. — O GLP é um velho conhecido e uma incrível solução. Temos capilaridade, presença, mas também liberdade. O preço do GLP não é controlado, é acompanhado. Os consumidores têm muito poder de negociação. O setor funciona bem graças a muito investimento privado e a uma regulação econômica que qualifica os serviços e os agentes em um nível elevado. Temos muito orgulho disso. Não constamos entre os 50 maiores problemas de nenhum Procon, estadual ou municipal — afirma o presidente do Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Gás Liquefeito de Petróleo (Sindigás), Sergio Bandeira de Mello. A forma atual de comercialização do gás de cozinha tem aval da população, como revela pesquisa realizada entre os dias 5 e 9 de junho pelo Instituto Locomotiva. Entre os 1.500 entrevistados de todas as regiões do país, 94% consideram a segurança o fator mais importante na hora da compra, mais do que o preço, e 97% acham importante a marca do botijão ser responsável por garantir a qualidade do gás. Em 2024, foram 7,6 milhões de toneladas comercializadas. Por ano, são feitas 400 milhões de cargas de GLP nos botijões de 13 kg, com venda mensal de 35 milhões de cargas. Há no país 19 distribuidoras de GLP e quase 60 mil pontos de revenda autorizados. Mudanças vistas com cautela Essa cadeia grandiosa, no entanto, vive momentos de indefinição, com a Análise de Impacto Regulatório (AIR) conduzida pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Relatório aprovado em julho propõe uma série de mudanças na comercialização do GLP que, na avaliação do Sindigás, podem expor a população a fraudes e riscos de acidentes. Os botijões de gás só podem ser vendidos cheios e lacrados. Cada distribuidora comercializa apenas os itens de sua própria marca, gravada em alto-relevo, para segurança do consumidor Divulgação/Sindigás Uma das propostas prevê que qualquer distribuidora poderá comercializar botijões de outras marcas, com base em um sistema de rastreamento que ainda não existe e nem foi testado. Além disso, permite que os botijões sejam enchidos em pequenas instalações, inclusive em áreas urbanas, de forma fracionada. Em vez de botijões cheios e lacrados, o consumidor poderia encher o vasilhame de 13 kg com a quantidade desejada de GLP. — As questões de venda fracionada e de não respeitar a marca têm uma capacidade enorme de desorganizar o mercado — alerta Bandeira de Mello. Redução de preços e ampliação do número de concorrentes são os objetivos apontados para a reforma nas regras do GLP, que ainda está em discussão. — Graças à regulação econômica atual, a identificação da marca não é rótulo, não é removível, é gravada em alto-relevo. Se você baixar muito as regras, vai ter mais agentes trabalhando, mas pode ter uma precarização muito grande da qualidade — afirma o presidente do Sindigás. Pesquisa mostra preocupação do consumidor Encomendada pelo Sindigás, a pesquisa do Instituto Locomotiva revela as preocupações da população com possíveis mudanças: 93% enxergam risco de adulteração ao comprar gás fracionado, enquanto 92% dizem que a compra de gás de forma fracionada traria risco de vazamento de gás e 90% veem risco de explosão. — A população tem uma percepção muito clara do que nós estamos falando. A regulação atual é o pilar do bom funcionamento do setor — diz Bandeira de Mello. A pesquisa mostra ainda que 86% consideram muito perigoso as pessoas andarem pela cidade com botijão para enchê-lo com gás fracionado e 94% afirmam que a flexibilização das regras traria risco de ligação com comércio ilegal ou com crime organizado. — A venda fracionada é um falso debate. O fracionado em qualquer produto é mais caro. É uma questão de escala industrial. Além disso, o enchimento do botijão, que é a parte mais perigosa do processo de comercialização do gás, se aproximaria das residências — complementa o presidente do Sindigás. Toda essa discussão acontece no momento em que o governo acaba de assinar a medida provisória que institui o programa Gás do Povo, substituto do Auxílio Gás. Em vez do depósito em dinheiro, o novo modelo prevê a gratuidade na compra do botijão de 13 kg e pretende alcançar 15,5 milhões de famílias. Dados do IBGE e da EPE mostram que 91% dos domicílios usam gás de cozinha, e 23% utilizam lenha para cozinhar. Em muitos lares o GLP é dividido com recursos menos seguros e prejudiciais à saúde. — Famílias dependentes do uso de lenha passam horas por semana catando esses recursos em meio à sucata. O auxílio gás não reduziu o consumo de lenha. O novo programa do governo focaliza na pobreza energética. GLP é inclusão energética, é dignidade — declara Bandeira de Mello. Para atender a nova demanda, o Sindigás estima que serão necessários entre cinco milhões e dez milhões de novos botijões: — As empresas estão se preparando para atender ao aumento da demanda, que estimamos em cerca de 11 milhões de novas residências com o Gás do Povo. Será necessário um grande investimento do setor privado em novos cilindros — algo em torno de R$ 2,5 bilhões —, porque o que muda é o giro operacional, pela velocidade maior das recargas. Esse é o primeiro investimento que o setor precisa fazer logo de cara — explica o presidente do Sindigás, Sergio Bandeira de Mello. O executivo reforça que o grande estímulo de manter a marca estampada em alto-relevo é justamente o incentivo econômico para investir na frota. — Quando sei que o botijão que coloco em circulação volta para mim, tenho segurança para reinvestir, seja na manutenção, seja na compra de novos. Agora, quem vai investir bilhões na compra e manutenção desses milhões de novos recipientes se não houver essa garantia? Sem ela, os investimentos se tornam inviáveis e o setor mergulha em insegurança jurídica. O Brasil hoje tem duas políticas que caminham em sentidos opostos: uma que estimula a inclusão energética e outra que ameaça a previsibilidade dos investimentos e precisa fazer uma escolha — finaliza.